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A governança por fazer
Controle pulverizado exige novas competências para o conselho e instrumentos eficientes de votação

 

O mercado de capitais brasileiro passou por rápida transformação nos últimos anos. Por meio de ofertas públicas ou privatizações, um fluxo significativo de capital estrangeiro invadiu a bolsa de valores destinando-se a financiar o crescimento de empresas familiares, estatais ou mesmo de companhias controladas por investidores institucionais. Com isso, a estrutura de capital dessas companhias mudou de forma relevante, abrindo espaço para situações em que a figura do acionista controlador é substituída pelo capital disperso entre inúmeros investidores. Adicionalmente, iniciativas da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e requerimentos do Novo Mercado da Bovespa deram enorme atenção ao desenvolvimento da integridade do mercado de capitais brasileiro e às práticas de governança corporativa.

Os benefícios que são fruto destas novidades certamente trazem grande satisfação a todos os participantes do mercado. Mas implicam também uma série de obrigações que deverão passar a fazer parte de sua rotina. Algumas delas se aplicam, por exemplo, aos conselhos de administração (CAs). Em uma companhia que possui controlador, é este mesmo acionista que se assegura de que os gestores estão conduzindo a companhia conforme os objetivos traçados. Já quando o capital é pulverizado, tal “governo” é delegado a um grupo de representantes, ou seja, ao CA. Para os “donos”, portanto, é essencial o conforto de poder contar com estruturas e processos que assegurem a adequada condução da companhia.

Com o crescimento de parcelas do capital em mãos de investidores, os “proprietários” passam, assim, a exigir que as informações sejam mais compartilhadas e as expectativas, melhor definidas. O CA torna-se ainda mais responsável por criar o vínculo entre os acionistas e a empresa, mantendo aberto um canal de comunicação ativa. Além disso, deve demonstrar habilidade para ser ágil e responder às turbulências econômicas que possam alterar o valor dos ativos que estão sob sua administração.

Ao mesmo tempo, os sistemas de negociação de ações, regulamentação e normas de governança — todos em rápida evolução — precisam atender às novas expectativas do mercado. Os que não atenderem serão vistos como ineficientes e precisarão de melhorias.

A Assembléia Geral Ordinária (AGO) ganhará muito mais importância, e os acionistas vão querer dela participar, exercendo seus direitos e, quando cabível, norteando o conselho para o seu próximo mandato. Assim, vão querer votar, opinar, propor resoluções, receber informações relevantes e, sobretudo, estar aptos a fazer valer todos esses direitos por meio de um proxy — procurador autorizado a exercer direitos legais em nome do acionista.

A legislação atual brasileira sobre proxy é específica, mas pouco detalhada, particularmente em relação aos investidores não-brasileiros. Na impossibilidade de atender a uma assembléia pessoalmente, o acionista pode, por meio de uma procuração autenticada, nomear um agente para votar no seu lugar. A definição de agente é restrita a advogados, outros acionistas ou instituições financeiras que são reconhecidos pela lei brasileira como autorizados a atuar como procuradores. A procuração deve ser apresentada em forma física.

Existe um consenso no mercado, porém, de que o tempo e o custo envolvidos fazem com que o processo fique longe do ideal. Num mercado de capitais dinâmico, no qual o exercício de direitos societários se torna cada vez mais importante, a lei e a regulamentação precisam acompanhar a demanda.

Nos EUA, a votação por procuração evoluiu por meio de lei estadual. Inicialmente, os princípios de common law restringiam a votação por proxy e acionistas tinham que comparecer pessoalmente às assembléias para exercer seus direitos. Com o surgimento de companhias pulverizadas, o comparecimento se tornou difícil, levando algumas empresas a ter dificuldades para compor o quórum nas assembléias — exatamente como acontece hoje no Brasil.

Devido à pressão dos acionistas e das empresas, estatutos foram modificados para permitir que acionistas votassem por proxy. Embora a legislação estadual agora permita esse tipo de votação, ela não é obrigatória. Tampouco a legislação estadual especifica os requerimentos de divulgação de informações para o voto por procuração, bem como seus procedimentos.

Mas a legislação evoluiu para preencher tais deficiências. Normas federais estipularam o nível de disclosure necessário para a solicitação de proxies. É requerido que o acionista receba um relatório anual e materiais com a devida abertura de informações sobre a pauta a ser votada, bem como sobre a pessoa ou entidade que originou a solicitação. A lei federal também rege o formato do proxy card e, quando o título do acionista é custodiado, a lei exige que as corretoras enviem o material de votação via um intermediário financeiro (contendo o proxy card) ou solicitem ao acionista a instrução de voto.

Uma proposta seria a colaboração entre diversas entidades para desenhar o processo ideal
É esperado que os investidores institucionais sintam pressões dos seus clientes para adotar políticas de votação

Na Europa, a Comissão Européia adotou um plano de ação em 2003 divulgando novas medidas e visando modernizar a legislação de empresas de capital aberto para melhorar a governança corporativa. No seu relatório, publicado em fevereiro de 2006, recomendou que os membros da União Européia retirassem quaisquer barreiras que restringissem quem poderia ser representante nas votações, os direitos de proxy e a forma de nomear os “procuradores”. Em linhas gerais, a recomendação estipulava que qualquer pessoa pode ser um representante, que ela deve receber os mesmos direitos de um acionista pleno e que os membros da EU podem utilizar meios eletrônicos para transferir tais direitos. Entre outras recomendações importantes, foi estabelecido um período mínimo de notificação para convocar a Assembléia Geral Ordinária e as empresas passaram a especificar a localização das informações sobre a AGO e os serviços de apoio para votação. Tornou-se obrigatória, também, a disponibilização das atas na homepage do site da companhia.

A experiência internacional mostra que o mercado brasileiro terá alguns desafios interessantes pelo caminho. Uma proposta seria a colaboração entre entidades regulatórias, advogados, empresas e investidores que, juntamente, desenhariam o processo ideal. A utilização de tecnologia oferece incentivos poderosos do ponto de vista de custo e eficiência. Com o crescente envolvimento das Câmaras de Liquidação e Custódia como prestadoras de serviços — a exemplo da plataforma de votação eletrônica estabelecida pela CREST no Reino Unido —, é possível se pensar em um papel para a CBLC neste sentido. É esperado também que os investidores institucionais sintam pressões dos seus clientes (os cotistas dos fundos) para adotar políticas de votação e exercer seu papel fiduciário por meio do voto.

Sem dúvida, as estruturas e processos que fazem o mercado de capitais brasileiro funcionar encontram-se em revisão. Uma abordagem focada na confecção de uma legislação e regulamentação pertinentes servirá para fortalecer sua posição de liderança na América Latina e sua importância no mercado global de títulos mobiliários.


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