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Riscos estruturais
Distorções nas práticas de private equity e venture capital no Brasil merecem reflexão

A atividade de gestão de fundos de venture capital (VC) e private equity (PE) atingiu proporções e resultados surpreendentes nos últimos anos em todo o mundo e, por isso, é cada vez mais estudada e debatida nos mais diversos mercados. Felizmente, para os praticantes dessa nova modalidade de gestão de ativos, nove entre dez análises sinalizam na direção de uma espiral virtuosa dos efeitos proporcionados pelo VC/PE. Afinal, desde a alavancagem da atividade empreendedora até a preparação e lançamento de novas companhias na Bovespa, o papel do VC/PE no desenvolvimento de qualquer economia é raramente contestado.

Sobre esse conjunto tão positivo dos papéis do VC/PE, emergiram duas conclusões fundamentais:

1. Adaptabilidade e escala: tornou-se evidente que VC/PE não representa um fenômeno norteamericano e, portanto, pode (e deve) ser adaptado a situações relativas a cada economia e sua dinâmica de exposição no mercado de capitais. O próximo desafio para atingir a ‘espiral virtuosa’ é capturar a escala mínima em todos os seus segmentos, permitindo um fluxo equilibrado de transações em toda a pirâmide corporativa. Ou seja, o segmento Private Equity não funcionará bem se, no elo anterior, o Venture Capital, estiver abaixo da escala, e assim por diante.

2. Gestores de hedge funds operando fundos de Private Equity: após as afirmações de que “esses atores não atingiriam o nível de consistência operacional, sendo tipicamente orientados a resultados de prazo mais curto”, os especialistas parecem agora se curvar aos benefícios do ingresso desses gestores no segmento, desde que incorporem as práticas do VC/PE corretamente e sem extensão indevida de equipes.

A partir dessas duas conclusões o que se vê, nos últimos três anos no mundo, é um show espetacular de consistência e resultados, com diversos efeitos positivos nos principais mercados de capitais. Ao investir em empresas para que logo após abram capital, ou saiam das bolsas para voltar mais fortes no período seguinte, estes fundos têm contribuído para o processo de depuração ou reestruturação do mercado como um todo. O VC/PE também expande o contingente corporativo auditado no mundo, além de estimular várias outras boas práticas de gestão e governança.

Para se ter uma idéia dessa explosão de vitalidade, nos anos 80 mais de 75% da atividade se concentrava nos Estados Unidos, e menos de 20 fundos estruturados anualmente passavam do porte de US$ 100 milhões. Chegamos ao final dos anos 90 com o impressionante recorde de algo acima de US$ 200 bilhões captados anualmente, embora ainda relativamente pulverizados numa grande quantidade de fundos.

Se na década de 80 poucos fundos passavam de US$ 100 milhões, hoje mais de 50 fundos com valor superior a US$ 1 bi são estruturados todo ano. E a cada ano, alguns dos oito ou dez maiores gestores globais anunciam megafundos acima de US$ 10 bilhões cada um, como foram os casos recentes do Texas Pacific Group, Blackstone Group, The Carlyle Group, KKR, Apax, Bain Capital e Permira.

Tais proporções dos chamados megafundos não se aplicam a nenhum contexto nacional, e sim a fundos globais ávidos por capturar ativos dentro das grandes bolsas, reestruturá-los ou recombiná-los para depois realizar ganhos. Nosso estágio é anterior a esse, mas estamos na entrada de uma nova safra — com grandes perspectivas, embora algumas distorções exijam reflexão e observação atenta.

Sem convicção e/ou experiência no longo prazo, investidores acostumados com a segurança dos juros altos têm influenciado modificações estruturais — sem avaliar com profundidade o funcionamento de fundos de, por exemplo, dez anos de duração, cuja medida de desempenho é aplicável apenas após a metade desse período.

Não fica ainda claro se estamos diante de um processo de adaptação e alinhamento gradativo, ou se tais variações se instalarão como distorções perenes. Por isso, é fundamental debater e analisar o processo em parceria com investidores, gestores e formadores de opinião, de forma a garantir que o VC/PE execute seus diversos papéis.

Existem algumas diferenças entre as práticas observadas no Brasil e no exterior que precisam ser analisadas pelo mercado

São três as principais diferenças associadas ao momento atual do VC/PE no Brasil, comparativamente às práticas consagradas no mercado internacional. Elas devem ser tratadas com cuidado, especialmente face ao aumento do contingente de fundos já em marcha no País:

1) Adequação dos benchmarks e acompanhamento intermediário, entre o início dos investimentos e o início da colheita (desinvestimentos): esse período, normalmente de cinco a sete anos, caracteriza-se por uma grande subjetividade na atribuição de valor para a carteira. No Brasil, os fundos de pensão têm acompanhado suas alocações iniciais em VC/PE através de instrumentos desenvolvidos para a categoria de renda variável tradicional. Os relatórios preparados pelos fundos de pensão (tipicamente os principais investidores do setor) para discussões internas e informação às autoridades reguladoras incluem itens não aplicáveis a um fundo fechado de longo prazo e, pior que isso, não acompanham variáveis importantes da operação de um fundo de VC/PE.

2) Absorção por investidores de parte do papel usual de gestores: no Brasil constata-se o fenômeno inusitado de participação ativa dos cotistas na decisão de investimento para a qual o gestor é contratado, pago e responsabilizado. Os Comitês de Investimento foram (mal) entendidos como Conselhos de Administração de empresas, e passaram a ser povoados por representantes de cotistas. Ainda que tal participação tenha efeitos iniciais positivos, é razoável supor que tal envolvimento produz uma limitação de escala e compromete a necessidade de diversificação dos próprios investidores. Ou seja, um investidor prudente deveria considerar investir em fundos de VC/PE diversificados. Na prática, hoje, cada investidor, salvo raras exceções, não tem estrutura para se envolver nesse nível de detalhes em tantos fundos.

3) Adoção de padrões de remuneração dos administradores abaixo dos níveis internacionalmente consagrados: administrar VC/PE representa atividade de custos consideráveis, pois uma equipe dedicada a um fundo deve estar preparada para selecionar, negociar e investir nos primeiros anos e, além disso, participar diretamente dos sistemas de governança corporativa de várias empresas, ao mesmo tempo em que se trabalham alternativas e negociações de desinvestimento. Além disso, os referenciais de remuneração devem garantir a retenção dessas competências por um prazo longo, em torno de dez anos, sem que haja normalmente previsão de reajuste na estrutura dos fundos. Em vários casos recentes de fundos brasileiros, as estruturas de remuneração têm sido perigosamente pressionadas, o que pode gerar: (i) dificuldades orçamentárias, mesmo em grandes organizações, na metade do percurso, (ii) atividade menos intensiva de investimentos ou, pior ainda (iii) uma combinação negativa das duas anteriores.

Observadas essas diferenças (ou adaptações contextuais) do PE/VC no Brasil, e garantindo-se a cautela necessária na administração das mesmas de forma conjunta entre gestores e investidores, o cenário positivo para este segmento é inequívoco.

Estamos numa fase única de alinhamento de fundamentos macroeconômicos e consenso na direção do maior crescimento e de maior taxa de retorno da economia brasileira. Como já ocorrido em vários países, a transformação dessa “energia potencial” em “calor empreendedor” terá no VC/PE um agente fundamental e um exemplo sólido de parceria público-privada. Caberá aos diversos agentes manter uma relação construtiva e aberta, que possa, de fato, resolver e seguir adaptando os conceitos para a nossa realidade. Isso mantido, teremos mais um caso internacional em que o setor de Venture Capital / Private Equity funcionará como ponte eficaz entre o desenvolvimento e o mercado de capitais.


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