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A Nyse listada na Nyse
Abertura de capital é tendência mundial e passo estratégico para aquisições de outras plataformas de negociação

 

Depois de mais de dois séculos atuando como uma empresa sem fins lucrativos, a Bolsa de Valores de Nova York (Nyse) decidiu, enfim, abrir o seu capital. No dia sete de março, concluiu o processo de compra da plataforma eletrônica de transações Archipelago, de Chicago, transformou a antiga rival em sócia e criou uma nova empresa: a Nyse Holdings, avaliada em US$ 11 bilhões. Uma boa notícia para quem já investia em ações da bolsa Archipelago. Os papéis da companhia triplicaram o seu valor desde que a Nyse anunciou, em abril do ano passado, a intenção de levar adiante a compra da concorrente.

Já no dia seguinte, Wall Street teve um pregão histórico: pela primeira vez, a Bolsa de Nova York teve a oportunidade de negociar as suas próprias ações, tornando-se, assim, uma empresa listada por ela mesma. A reação do “floor” foi positiva. Mal se conseguiu ouvir o sino que dá largada aos negócios, tamanho foi o apetite dos investidores pelos novos papéis. John Thain, executivo-chefe da Nyse, e Marshall Carter, presidente, foram os primeiros a se aventurar. Cada um comprou um lote de cem ações negociadas sob o código NYX, lançadas a US$ 64. Pagaram US$ 67 e viram o painel atingir US$ 80 ao final da sessão, com ganho de 25%. Nada mal para o primeiro dia.

Mas nem todos ficaram satisfeitos com o negócio. Em meio aos gritos de oferta e procura, ouvia-se uma revolta corrente de vaias. Eram alguns dos especialistas (operadores responsáveis pela compra e venda de determinados papéis) que hoje trabalham no “floor” e sabem que seus empregos estão com os dias contatos.


QUEM REGULA QUEM — Com a abertura de capital, muita coisa mudou dentro da Nyse. Agora a bolsa nova-iorquina não tem mais o mesmo poder de auto-regulação — ou seja, não pode tomar determinadas decisões sem consultar a Securities and Exchange Commission (SEC). Será preciso ouvir a agência reguladora do mercado norte-americano e, também, seguir suas regras, que se tornaram bem mais restritas depois da lei Sarbanes-Oxley (SOX).

Mesmo assim, a Nyse continuará com mais poder de auto-regulação do que alguns parlamentares gostariam. O senador republicano do Alabama, Richard Shelby, presidente do Comitê Bancário do Senado americano, questionou a adequação do sistema auto-regulador da Nyse agora que a instituição passou a atuar como uma empresa com fins lucrativos. “Apesar das mudanças realizadas na estrutura de governança, ainda restam dúvidas se a robusta e vigorosa auto-regulação vai se subordinar às atividades lucrativas”, disse Richard em discurso ao Comitê Bancário, responsável por monitorar a atuação das bolsas de valores no país.

John Thain rebateu. Para ele, o novo sistema de governança da Nyse tem sido bastante eficiente em combater o conflito de interesses entre as prioridades comerciais do grupo e o dever da bolsa de proteger os investidores em seu papel de entidade reguladora. “As nossas funções nunca intersectam com as atividades comerciais.”


TENDÊNCIA MUNDIAL — A abertura de capital da Nyse não é um exemplo isolado. Pelo contrário, revela uma tendência que pode ser observada em diversas partes do mundo. Entre os casos de maior sucesso está o da Bolsa de Valores de Chicago (Chicago Board of Trade, CBOT) e o da Bolsa de Toronto. Há seis anos, um assento na bolsa canadense, por exemplo, tinha valor de mercado equivalente a US$ 50 mil. Hoje, este mesmo assento pode ser vendido por nada menos do que US$ 35 milhões. Além disso, a Bolsa de Toronto tem uma das margens de operações mais vantajosas do mundo.

Porém, não se engane. Comprar ações de bolsas de valores que resolveram abrir seu capital pode até ser um investimento atraente, mas tem lá suas vulnerabilidades. Thomas Caldwell, presidente e estrategista-chefe de investimentos da Caldwell Asset Management, em Nova York, diz que o preço deste tipo de ação pode estar supervalorizado com a recente excitação do mercado. “Nesse momento há um certo grau de euforia.” Mesmo assim, ele ainda acredita que esses negócios sejam promissores no longo prazo. “Aposto que daqui a três anos o preço das ações da Nyse estará significativamente maior que o de hoje”, avaliou Caldwell, que já esteve à frente da Bolsa de Valores de Toronto.

Mas será que essa tendência de supervalorização poderia se agravar e gerar uma bolha neste nicho do mercado? Bem, segundo o especialista Richard Repetto, da Sandler O’Neill, empresa que presta serviços financeiros e de investimentos em Nova York, não é provável que isso aconteça. “Os preços estão em alta já faz um tempo e não devem sofrer uma queda drástica”, afirmou. “É claro que sempre existe a possibilidade de uma bolha, mas não acho provável.”

NOVAS FUSÕES — A abertura de capital não é a única estratégia das bolsas de valores para ampliar seus negócios. Na verdade ela é apenas parte de um movimento maior de reposicionamento dessas instituições. Em busca de ampliar sua atuação não só no mercado de ações, mas também nos negócios com opções, fundos e outros derivativos, as bolsas americanas estão em uma verdadeira cruzada por novas fusões. Grandes empresas como a Nyse e a sua principal concorrente, a plataforma eletrônica Nas daq, estão cada vez mais inclinadas a fazer propostas para arrebatar concorrentes menores. Foi dentro desse contexto que a Nyse se interessou pela aquisição do pregão Archipelago e a Nasdaq, pela fusão com o seu mais vigoroso rival: o pregão eletrônico Inet, em dezembro do ano passado. Agora, as bolsas de valores de Chicago, de Boston e da Filadélfia são as que encabeçam a lista das mais cobiçadas.

Mas as consolidações não devem ficar restritas às possibilidades domésticas. John Tain, da Nyse, já cansou de repetir que a bolsa já está pronta para ingressar em uma “competição global”.

Na tentativa de sair à frente nesse quesito, a Nasdaq tomou a iniciativa, pela segunda vez, de fazer uma proposta para aquisição da Bolsa de Londres (LSE). Em 2002, o negócio não foi adiante porque agências reguladoras americanas e britânicas não chegaram a um acordo sobre quem iria regular o novo mercado.

Desta vez, o “timing” tinha tudo para ser perfeito. A estratégia era aproveitar o momento em que a Nyse estaria com as atenções totalmente voltadas para o seu processo de consolidação e, desta forma, evitar qualquer tipo de concorrência ou contra- proposta. Mas a precaução foi maior que o necessário: a LSE simplesmente recusou a oferta hostil de US$ 4,1 bilhões feita pela Nasdaq. A tentativa de criar o primeiro mercado mobiliário com dimensões transatlânticas foi por água abaixo.

Juntas, a Nasdaq e a LSE teriam mais de 6 mil companhias abertas sob a sua listagem, com valor de mercado equivalente US$ 7,3 trilhões. Para efeito de comparação, em dezembro, as companhias listadas pela Nyse somavam US$ 21 trilhões, sendo US$ 7 trilhões relativos somente a empresas sediadas no exterior.

Essa foi a terceira proposta de aquisição que a LSE recebeu em menos de um ano. Uma instituição alemã e outra australiana já haviam feito seus apelos, mas nenhuma chegou perto de obter sucesso. O interesse pelo mercado britânico é cada vez maior. Afinal, o interesse de companhias abertas em listar suas ações no país tem crescido bastante, já que o mercado americano, fortemente regulado, é muitas vezes considerado hostil, principalmente por empresas de menor porte.


E OS EMERGENTES? — Diante da necessidade de expandir os seus limites de atuação e da ferrenha competição por consolidações em países ricos, os mercados emergentes surgiram como uma opção promissora. Apesar de ser muito mais fácil encontrar exemplos de abertura de capital entre bolsas de valores localizadas em países ricos, os emergentes não estão totalmente por fora dessa tendência. São os casos da Bolsa de Hong Kong, de Cingapura, da Austrália e do Vietnã, só para citar alguns.

De acordo com Thomas Caldwell, estes exemplos poderiam ser bem mais numerosos não fossem os riscos geopolíticos dos países em desenvolvimento. “Toda bolsa tem um risco agregado a ela, que é tão maior quanto mais instável for o seu país de origem”. Para o especialista, a América do Sul é uma região muito interessante, com economias muito “vibrantes.” “O problema é que poucos investidores estrangeiros a conhecem como deveriam. O maior empecilho é a falta de informação”, lamenta.

E como saber se um país emergente está pronto para assumir o desafio de abrir o capital de suas plataformas de negociações? Em primeiro lugar, é necessário que o país seja confiável. Em segundo, que a bolsa em questão tenha um volume considerável de ações e outros ativos negociados.

Só que este passo não é tão simples quanto parece. David Easthope, analista da Celent Communications, empresa de consultoria financeira, também de Nova York, explica que a decisão de abrir o capital de uma bolsa de valores é muito mais política do que técnica. Ao deixar de ser um “clube de investidores” para transformar- se em empresa com fins lucrativos, a plataforma que resolve abrir o seu capital passa a ter que ouvir e prestar contas aos seus acionistas, que geralmente são muito mais numerosos e exigentes do que os membros fundadores. “Em países emergentes as bolsas são vistas como empresas na mesma categoria que as de serviços públicos, como água, luz, gás, etc. Ou seja, há quem acredite que estas instituições não deveriam ficar reféns da ganância dos acionistas que querem, em última instância, apenas maximizar os seus lucros”, afirma Easthope.

Em todo caso, potencialidades e empecilhos à parte, o fato é que, no Brasil, “o assunto não se encontra em discussão no momento”, segundo informou a assessoria de imprensa da Bovespa à Capital Aberto. Entretanto, o mercado é dinâmico e está em constante evolução. No passado, quando algumas bolsas de outros países emergentes, e também da Europa, optaram por deixar de ser associações para se tornar empresas, a Bolsa estudou o assunto com o objetivo de entender o movimento, mas não aprofundou as discussões e o processo parou por aí.

Se David Easthope tivesse que dar um conselho sobre o que a Bovespa deveria fazer para se preparar para esta tendência, não teria dúvidas em dizer: “Continuar investindo pesadamente em tecnologia. Só assim, uma bolsa tem disponibilidade para encarar qualquer desafio que apareça no futuro”, afirma. Estar capacitada para integrar o seu sistema de negociações a outros mais avançados é também pré-requisito fundamental para que uma bolsa se candidate a menina dos olhos de outras plataformas internacionais.


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