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Segundo passo
Iniciativas de pulverização abrem espaço para a formação de um mercado de compra e venda de controle no País

 

Notícias recentes anunciam termos alcançado certa maturidade em nosso mercado de valores mobiliários. De fato, com a decisão da Lojas Renner de pulverizar o seu controle acionário, parece ter-se iniciado uma nova era em nosso mercado de capitais. Espera-se, assim, que esta tendência continue, de maneira a desenvolver um mercado secundário para compra ou venda do controle de empresa (“market for corporate control”) em operações que não sejam as meramente privadas, como se tem observado até então.

O controle acionário das companhias, mesmo as de capital aberto, é normalmente adquirido privadamente, ou seja, sem as chamadas “tomadas hostis” tão vistas no mercado norte-americano. No Brasil, tais operações são raras, principalmente pela falta de pulverização do controle acionário das empresas.

Não se defende, aqui, a adoção pura e simples do modelo utilizado nos Estados Unidos. O mero “transplante” do sistema de um país para outro poderia até ser mais prejudicial do que benéfico. No entanto, por um lado, parece-nos que o desenvolvimento do mercado de capitais nos Estados Unidos permite a captação de enormes volumes de recursos a juros mais baixos do que os praticados por instituições financeiras em geral. Isso pode ser positivo tanto para as empresas como para o desenvolvimento econômico.

Por outro lado, as empresas americanas de capital disperso são constantemente monitoradas pelo mercado, o que as faz buscar resultados cada vez melhores. Afinal, balanços ruins podem significar valores menores em bolsa e uma vulnerabilidade maior a ofensivas hostis de tomada de controle. Em tese, tal dispersão acionária leva as empresas a gerar resultados mais atraentes. Não se pode esquecer, entretanto, que este monitoramento constante e a busca por resultados imediatos levou a práticas pouco éticas e até mesmo ilícitas, ocasionando uma série de escândalos corporativos nos Estados Unidos.

Com a tomada hostil de uma empresa, principalmente nos moldes norte-americanos, uma das primeiras tarefas dos novos controladores é providenciar a troca do time de administradores, com a utilização dos instrumentos de governança corporativa disponíveis na legislação em vigor. Por isso, o “market for corporate control” de empresas de capital aberto pode servir como um ótimo incentivo para que os administradores evitem resultados medíocres ou negativos nas empresas que gerenciam.

Se esta tendência — que começa a ser delineada em nosso mercado de capitais — se concretizar, várias questões deverão ser suscitadas em nosso Direito, como já ocorreu nos Estados Unidos.

Durante a década de 80, houve intensa atividade de tomadas hostis naquele país, motivadas, principalmente, pelo aquecimento dos mercados de “junk bonds”, ou “high yield bonds” que, em grande parte, financiaram tais operações. Com dinheiro disponível, as tomadas hostis foram extremamente caras, mas transferiram bastante riqueza aos acionistas.

Essa intensa atividade serviu como campo fértil para que dispositivos jurídicos fossem criados, na tentativa de dificultar as tomadas hostis e gerar riqueza para os acionistas. Advogados atuantes no mercado de capitais desenvolveram instrumentos societários que se tornaram famosos, tais como os “poison pills”, os “shark repellents”, os “dead hand poison pills” ou os “white knights”. Uma vez colocados em prática, tais dispositivos tornam mais caras as operações de tomada hostil. Ou seja: não necessariamente impedem as operações, mas forçam os compradores a oferecer mais dinheiro aos acionistas, ou a negociar a compra. De qual- quer forma, depois de efetuada a operação, os acionistas costumam contabilizar um bom ganho.

Vários destes dispositivos acabaram por ser discutidos em juízo, principalmente na Court of Chancery, do pequeno estado americano de Delaware. Alguns casos se tornaram tão célebres que acabaram virando filmes, como o da aquisição da RJR Nabisco. Além dos mecanismos acima mencionados, as empresas que passaram por processo de tomada hostil também utilizaram como forma de defesa alguns outros, bastante criativos.

Da mesma forma que os tribunais americanos — notadamente a Court of Chancery — definiram o que seria legal ou ilegal como instrumento de defesa em uma tomada hostil, delineou- se muito do que é aplicado corriqueiramente pelos especialistas em finanças empresariais. Em um caso clássico e muito estudado nas faculdades de Direito nos Estados Unidos, a referida Corte decidiu que, se há mais de um possível adquirente para a compra das ações de uma empresa, as negociações não podem ser terminadas até que se chegue à maior oferta. Caso contrário, os administradores podem estar descumprindo seus deveres fiduciários em relação aos acionistas da empresa. Foi este o caso da disputa pelo controle da Revlon, em que os acionistas aceitaram uma oferta que não era a maior, trancando a operação.

A ameaça de ofertas hostis incentiva os executivos a gerar resultados mais atraentes e valorizar a companhia
Estaria o Brasil preparado para o seu “market for corporate control” de empresas de capital aberto e controle pulverizado?

Vários outros casos poderiam, ainda, ser citados para demonstrar que as cortes norte-americanas tiveram importante papel na delineação das estratégias utilizadas nas tomadas hostis daquele mercado. Notese, no entanto, que um dos motivos de a Court of Chancery ser uma das mais solicitadas é, justamente, a sua especialização em direito societário e mercado de capitais. Seus juízes são notoriamente conhecedores do assunto, com vasta e comprovada experiência. Por outro lado, muitos desses juízes possuem formação em economia e finanças e são profundos conhecedores dos meandros do mercado de capitais. É bastante difícil encontrar uma decisão que não leve em conta os possíveis efeitos econômicos aos acionistas e à população em geral. A corte de Chancery é também prestigiada por sua agilidade nos julgamentos. Em questão de poucos meses, é possível ter um processo julgado em primeira e segunda instância.

A questão a ser perguntada agora é: estaria o Brasil preparado para o seu “market for corporate control” de empresas de capital aberto e controle acionário disperso? Estaria o Brasil maduro para resolver conflitos que possam surgir entre acionistas majoritários, minoritários e administradores? Tais conflitos podem incluir também aqueles que ainda não são acionistas, mas almejem fazer uma tomada hostil.

Nossa legislação já regulamenta as ofertas públicas para aquisição de ações. A Lei das Sociedades Anônimas, nos artigos 254-A e 257, trata deste assunto, bem como a Instrução 361 da CVM. Mas, uma vez criado este “market for coporate control” para empresas de capital disperso, torna-se provável que operações como as vistas nos EUA na década de 80 venham a ocorrer.

O que, no entanto, irá demonstrar nossa maturidade será o posicionamento e a seriedade que os magistrados terão ao decidir os casos trazidos ao Judiciário. Há muita reclamação sobre os problemas enfrentados pelo Poder Judiciário brasileiro. Mas, se isso é verdade aqui, também pode ser verdade em qualquer lugar do mundo.

As soluções existem e podem ser alcançadas. O Estado do Rio de Janeiro, por exemplo, se adiantou e criou varas especializadas em Direito Empresarial. A Bovespa, como grande incentivadora do desenvolvimento do nosso mercado acionário, criou a chamada Câmara de Arbitragem para o Mercado, e tornou obrigatória a sua utilização para que sejam dirimidas disputas para determinadas empresas nela listadas, por meio de instrumentos contratuais e de auto-regulamentação.

Só não podemos nos acanhar. Esta é uma enorme e bem-vinda oportunidade para que possamos atingir maiores níveis de desenvolvimento, incentivando o crescimento econômico por meio do nosso mercado de capitais.


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