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Quebra de paradigma
O princípio de independência do conselheiro funciona melhor como uma obrigação ou uma opção analisada caso a caso?

 

Sob a ótica do Código de Melhores Práticas de Governança Corporativa do IBGC, crescem as vozes que defendem a presença obrigatória de conselheiros de administração nas empresas de capital aberto que possam ser caracterizados como independentes. Tal documento não considera como independentes aqueles conselheiros que sejam acionistas controladores, membros do grupo de controle, cônjuge ou parente até segundo grau destes, ou vinculados a organizações relacionadas ao acionista controlador. Vale registrar que tal conceito é mais amplo do que o preconizado pela rigorosa lei norte-americana Sarbanes-Oxley ao tratar da composição do comitê de auditoria, pois a restrição atinge somente o vínculo direto à companhia, seja este de caráter remuneratório (por prestação de serviços de consultoria/assessoria) ou por coligação à empresa ou suas subsidiárias (entenda-se por participação acionária relevante nestas estruturas). Buscou-se com isso evitar a danosa relação administrador-conselho, tão comum em recentes escândalos corporativos.

Por sua vez, recente material elaborado pela Capital Aberto — o Guia de Governança Corporativa para Investidores — recomenda que os conselhos de administração sejam formados, em proporção razoável, por membros totalmente independentes (excluindo funcionários, ex-funcionários, prestadores de serviços e pessoas que tenham qualquer outro vínculo com a companhia ou seu acionista controlador).

Nesse ponto surge a primeira questão: será que aqueles conselheiros eleitos pelo acionista controlador não observam o preceito legal que determina o compromisso de lealdade para com a companhia (artigos 154 e 155 da Lei 6404/76)?

O dirigente máximo do órgão regulador do mercado de capitais brasileiro é claro: nenhum conselheiro é obrigado a votar matéria prejudicial à companhia em que atua, mesmo que sob orientação do grupo de acionistas que o indicou ou sob a ameaça de destituição prevista em acordos de acionistas. A orientação do regulador se faz no sentido de garantir a independência do conselheiro em relação ao acionista/grupo de acionistas que o elegeu, devendo ser registrado o voto discordante, mesmo que este não seja considerado (nos termos do §8º do artigo 118 da mesma Lei).

Um segundo aspecto também é merecedor de especial atenção: será que os analistas de investimentos e investidores estão realmente preocupados com a composição do conselho de administração? Ou será que seus olhos estão voltados para a composição do grupo de controle (qualidade, experiência empresarial e compromisso com o mercado), as estratégias construídas por este grupo e, como conseqüência, a sua implementação por executivos profissionais que gerem resultados positivos e consistentes conjugados a dividendos? Vale perguntar àqueles que acompanham diuturnamente as principais companhias abertas brasileiras os nomes de pelo menos dois membros dos conselhos de administração dessas empresas e ainda qual o grau de independência destes nomes em relação aos controladores. Provavelmente não obteremos respostas, mas certamente todos se lembrarão de nomes como Roger Agnelli, Maurício Botelho e Nildemar Secches.

Avalio que o nível de transparência, somado ao poder de fiscalização por acionistas minoritários e às boas práticas de governança corporativa, sob uma ótica mais ampla, é o que importa. Nesse ponto não existe dúvida sobre a regra maior do mercado: investidores insatisfeitos com a estratégia e o desempenho operacional de uma companhia simplesmente vendem os papéis. Até porque não existe uma métrica para avaliar o grau de independência ou a atuação dos conselheiros.

Outro ponto que é negligenciado nesse debate: será que os conselheiros eleitos por preferencialistas e ordinaristas minoritários não devem ser considerados como totalmente independentes (copiando a expressão utilizada pelo referido guia)? É impensável que um conselheiro eleito por minoritários se sujeite a realizar reuniões prévias com seus eleitores para tratar da vinculação de seu voto. E como ficam os conselheiros eleitos por empregados, tão comuns em empresas privatizadas? Será que devemos colocar esses grupos sob suspeita no que diz respeito à independência e lealdade para com as companhias?

Convém, inclusive, lançar um alerta: a participação de acionistas nas assembléias, tanto ordinárias como extraordinárias, é pífia no Brasil. Empresas com bases acionárias que ultrapassam centenas de milhares de investidores realizam assembléias com acionistas que cabem em um auditório de colégio de ensino médio. Neste cenário, os conselheiros tidos como independentes acabam sendo apoiados pelo controlador e aprovados em assembléia pela maioria de votos detida por este acionista. As vagas disponíveis para conselheiros indicados por minoritários, que poderiam ser considerados independentes devido à ampla base de acionistas que representam, muitas vezes não são sequer preenchidas por falta de um quórum mínimo desses investidores.

Não seria então o caso de fomentarmos a participação nas assembléias, incentivando, por exemplo, o mecanismo de representação por procuração tão comum no mercado norte-americano? Que tal lutarmos para que pelo menos as companhias listadas nos segmentos especiais da Bovespa adotem os percentuais reduzidos descritos na Instrução 324 da CVM, aplicáveis à eleição de conselheiros fiscais, também na eleição de representantes dos minoritários nos conselhos de administração? A Instrução reduz os percentuais mínimos de participação acionária exigidos para eleição de conselheiros, conforme o tamanho do capital social integralizado.

O presente artigo não se propõe a desqualificar a figura do dito “conselheiro independente”. Longe disso, busca realçar a necessidade de fomentarmos uma participação mais efetiva daqueles que colocaram seus recursos em risco. Afinal, quantas empresas simplesmente deixam de eleger representantes de acionistas minoritários ou instalar conselhos fiscais somente por falta de acionistas para fazê-lo?

Será que devemos colocar sob suspeita os conselheiros eleitos por minoritários ou por empregados no que diz respeito à independência?

Em nosso país, é comum a presença de um ou mais conselheiros independentes nas empresas com controle familiar, onde uma figura neutra, geralmente com larga experiência no mundo empresarial, atua como mediador entre os executivos e a família, quando esta já se encontra afastada da gestão e passa a atuar somente na elaboração de estratégias e fiscalização das atividades executivas.

Mais recentemente, empresas que migraram da condição de capital fechado para abertas optaram por convidar “famosos” de mercado, como ex-presidentes/ diretores do Banco Central, BNDES, Comissão de Valores Mobiliários e até ex-ministros para compor seus conselhos. Buscam, com isso, garantir e deixar transparecer um elevado grau de profissionalismo e independência do conselho de administração, antes formado exclusivamente por membros da família ou pessoas próximas (ex-empregados, parentes e outros), geralmente desconhecidas do mercado.

Em outras situações, igualmente válidas, controladores optam por convidar um especialista para compor o conselho de administração por se tratar de um negócio inteiramente novo, como foi o caso das operadoras de telefonia celular da banda B. Neste caso o especialista atua como contraponto aos executivos, conferindo maior segurança nas decisões.

Resumidamente, podemos concluir que, devido à estrutura de capital predominante no Brasil, com grupos de controle claramente definidos, a composição dos conselhos de administração deve respeitar o esforço de capital realizado por cada grupo. Muitas vezes essa composição traz um formato relacionado com direitos de veto de cada grupo de acionistas em decisões estratégicas, o que levaria a um incremento desses conselhos somente para atender à regra de presença de “independentes”. A responsabilidade na tomada de decisão, e estamos falando basicamente de definição de estratégias, guarda relação direta com o desejo de perpetuar a companhia, com a geração de resultados e o conseqüente incremento do nível de atividade. Sob essa ótica, ganham os acionistas e ganha a sociedade.


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