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Primeiros ajustes
Instrução 400 completa dois anos e CVM apresenta propostas para alterar regras

 

A Instrução 400 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) completa dois anos neste mês de dezembro. Lançada para substituir as regras em vigor para as ofertas públicas de títulos e valores mobiliários numa época de plena escassez dessas ofertas, ela veio como bom presságio e logo foi seguida pelas emissões de ações e debêntures que reanimaram o mercado de capitais. Foi assim que “a 400”, como costuma ser chamada, concebida em tempos de muita teoria e pouca prática, teve a chance de ser testada pelo mercado. E acumulou experiência suficiente para que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) decidisse submetê-la à primeira reforma.

As mudanças foram apresentadas ao colegiado pelo diretor Pedro Oliva Marcilio de Sousa e à área técnica da autarquia no final de novembro. Se aprovadas, poderão ser submetidas à audiência pública antes do final do ano. As propostas passam pela flexibilização de regras controversas no mercado, como a restrição à negociação de títulos ofertados pela tesouraria dos bancos coordenadores da operação e as regras de silêncio impostas ao período da oferta – ambas contidas no artigo 48 da Instrução.

Quanto à negociação pelas tesourarias, Souza propôs um prazo menor para a restrição – cinco dias antes do fechamento do preço – e a aplicação da regra apenas para o ativo que for objeto da oferta – hoje as tesourarias não podem negociar com nenhum valor mobiliário que seja do mesmo emissor.

Os críticos à regra no seu formato atual argumentam que ela gera efeitos colaterais prejudiciais ao mercado, como, por exemplo, a sinalização de que uma oferta pode estar a caminho quando um banco pára abruptamente de negociar com os títulos de determinada companhia. Sobre o mesmo artigo, também foi proposta a permissão para negociação pelos bancos a qualquer tempo durante a oferta, desde que comprovada a segregação qualificada entre a área que presta serviços ao emissor e a tesouraria. “Mas para isso precisaríamos ter uma clareza do que seria esse padrão ideal de segregação”, afirma Souza.

A autarquia também avalia mudanças nas regras do período de silêncio (quiet period) e de veiculação de material publicitário (ver texto na página 20), além da dispensa da apresentação do estudo de viabilidade econômico-financeira da companhia ofertante. Quanto a este último ponto, a idéia é restringi-lo a quatro situações: quando o patrimônio líquido (PL) do último balanço é negativo, os prejuízos nos últimos três anos são iguais ou superiores a 20% do PL, a companhia está em fase pré-operacional ou quando é constituída por subscrição pública.

Quando surgiu, a Instrução 400 deu muitos motivos para que os profissionais comemorassem. Veio para unificar a regulamentação sobre ofertas públicas, que antes era dividida conforme o tipo – a Instrução 13 regulava as ofertas primárias e a 88, as secundárias -, e teve como pilares a transparência e a prestação de informação aos investidores. Exigiu a redação de prospectos detalhados sobre a companhia emissora e de todo o risco que envolve o negócio, além do estabelecimento de normas de conduta dos ofertantes, emissores e intermediários. Com ela, foram introduzidos conceitos que deram agilidade aos emissores, como a dispensa de registro das ofertas em determinados casos e a criação de programas de distribuição de valores mobiliários. A instrução também incorporou práticas bem vistas pelo mercado como as ofertas suplementares (green shoe) e o sistema de formação de preços em leilão (bookbuilding).

“Em alguns pontos a regulamentação está um pouco engessada, mas isso faz parte do desenvolvimento do nosso mercado”, diz Antonio Felix de Araújo Cintra, sócio do escritório Tozzini, Freire, Teixeira e Silva. “De modo geral, o sucesso das emissões no período mostra que a instrução vem funcionando bem.”

O período de silêncio é um dos itens mais polêmicos da instrução. Segundo o inciso 4º do artigo 48, as emissoras e intermediários devem abster-se de qualquer manifestação na mídia sobre o ofertante ou a oferta até que seja publicado o anúncio de encerramento da operação. Esta exigência tem sido cumprida com rigor pela CVM. Apenas no mês de novembro, a autarquia suspendeu temporariamente as ofertas de ações da Guararapes e da Cosan por desobediência ao inciso 4º.

Na primeira, a autarquia entendeu que não foi respeitada a recomendação de se abster de comentários na mídia antes do fim da oferta. Na Cosan, além desta falta, a CVM considerou que intermediários fizeram à mídia declarações que não constavam do prospecto. A preocupação da autarquia é atuar de forma ainda mais rigorosa porque o momento é de grande atividade do mercado.

“Seria interessante se a CVM desse mais esclarecimentos sobre o quiet period por meio de um parecer de orientação”, diz o advogado José Eduardo Carneiro Queiroz, do Mattos Filho, Veiga Filho, Marrey Jr., Moherdaui e Quiroga. No seu entendimento, o período de silêncio não se aplica às informações que estão no prospecto da oferta, e as companhias deveriam poder falar à mídia para informar os investidores em uma linguagem mais acessível, desde que não privilegiem determinado grupo, e que não os sugestionem com projeções sobre o comportamento futuro das ações.

“O silêncio absoluto da companhia no período da oferta pública é um tanto extremado”, considera Eliana Chimenti, sócia do escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice. Ela acredita que a regra poderia ser flexibilizada, a exemplo do que vem fazendo a Securities and Exchange Commission (SEC) nos Estados Unidos. Em sua visão, o que não deve ser permitido é o emissor ou banco passar informações que não são públicas (não constam do prospecto) a pequenos grupos. No entanto, tecer comentários sobre informações que já são públicas não deveria ser uma iniciativa mal vista e passível de sanções.

Falando em normas de conduta, outro ponto sensível é o que impede a tesouraria do banco intermediador de negociar quaisquer ativos de emissão do cliente. Queiroz, do Mattos Filho, considera a restrição sem sentido do ponto de vista conceitual. Ele observa que, se as áreas de gestão de recursos e as tesourarias dos bancos devem ser segregadas conforme exige a regulamentação, teoricamente, esta proibição perde o efeito – uma vez que as informações que dizem respeito à oferta pública não saem da área do banco que estrutura a operação. Outros já enxergam a restrição com naturalidade, como parte das regras do jogo. “A proibição de atuar com ativos do emissor implica em custos com os quais as instituições que querem atuar em todas as áreas devem arcar. Esse tipo de proteção deve existir para evitar abusos”, diz Marcelo Mesquita, estrategista do Banco UBS.

Alguns outros aspectos, como as ofertas de Fundos de Investimento em Participações (FIP) e Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDCs), feitas por meio da 400, mereceriam maiores esclarecimentos, acredita o advogado do Mattos Filho. Esses fundos podem obter registro automático na CVM, o que faz com que prontamente o distribuidor possa vendê-los no mercado. No entanto, se a autarquia considerar que a documentação é insuficiente ou solicitar algum tipo de ajuste, as cotas já terão sido distribuídas no mercado. Apesar dos elogios e da tenra idade, é provável que, na visão do mercado, a Instrução 400 saia desta reforma ainda com arestas a aparar.

CVM avalia flexibilização do artigo que proíbe manifestação na mídia

Na pauta de discussões da autarquia sobre a reforma da Instrução 400 está a mudança do inciso 4º, artigo 48, que proíbe o emissor e outros agentes relacionados à oferta pública de se manifestar na mídia sobre a operação, até a publicação do anúncio de encerramento. Segundo Pedro Oliva Marcilio de Sousa, a proposta é liberar a exposição na mídia, desde que as informações prestadas sejam restritas a dados factuais e já mencionados no prospecto.

O diretor também apresentou mudanças quanto às regras para publicidade. O objetivo é que a autarquia seja ainda mais rigorosa neste quesito, aumentando o prazo para análise do material publicitário pela CVM (igualandoo ao período para avaliação da oferta) e exigindo o plano de exibição na mídia.

A proibição do contato com a imprensa é um tema controverso dentro do colegiado e da área técnica da autarquia. Alguns argumentam que a restrição é necessária por não haver segurança de que a imprensa apresentará as informações obtidas de forma crítica e de modo a evitar que o investidor seja condicionado a comprar os papéis. Questionado sobre a garantia de que outros agentes de comunicação com o investidor, como os analistas e consultores de investimento, tenham a desejada postura crítica, Sousa argumenta que esses interlocutores estão sob vigilância da CVM, o que poderia implicar-lhes alguma punição. Afirma, ainda, que a imprensa tem visibilidade e influência muito superiores à desses profissionais e que possui, por sua isenção, um poder maior de formar opinião.

As críticas às restrições da CVM aumentaram em junho deste ano, quando a Securities and Exchange Commission (SEC) flexibilizou as suas regras de silêncio, especialmente para as companhias com maior liquidez e mais conhecidas no mercado. Antes, a agência americana tinha normas mais restritivas que as da CVM e as aplicava a todo o público de forma homogênea, incluindo-se aí os investidores e a imprensa. Ao flexibilizá-las, manteve o mesmo princípio, de modo que tudo o que foi permitido para o investidor foi liberado também para a imprensa.

No Brasil, ao contrário, até a recente proposta de mudança, a CVM permitia a comunicação com todo o mercado – investidores, analistas, corretores, consultores de investimentos e outros interessados na oferta – mas excluía a imprensa por meio da regra do inciso 4º. Assim, estimativas em relação ao desempenho dos papéis após a oferta como, as realizadas por representantes da Cosan em road show, ficariam, devido à restrição imposta, limitadas ao público que teve acesso ao evento, sem que o restante do mercado pudesse tomar conhecimento delas e fazer uma avaliação dos seus efeitos. O desrespeito dos representantes da companhia à regra da CVM, ao fazer declarações claramente vedadas, também teria, provavelmente, passado despercebido pela autarquia se a imprensa não tivesse dado visibilidade à informação.

A expectativa do diretor, contudo, é de que, mesmo com a extinção da regra, a imprensa continue sendo excluída de entrevistas ou de road shows, mas desta vez por decisão das próprias companhias. “Elas vão ter receio de que o jornalista distorça a declaração de um executivo e comprometa a oferta”, afirma. A CVM também pretende continuar utilizando as suspensões das ofertas, como nos casos Cosan e Guararapes, para dar orientações ao mercado de como pretende punir a língua solta dos emissores.


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