A década de cinqüenta do século passado assistiu nas empresas com ações negociadas no mercado de capitais internacional a separação entre a propriedade e a administração, com a criação dos boards, cujos poderes foram se ampliando ao longo do tempo. Nos anos noventa surgem os princípios de governança corporativa, com a finalidade de tornar tais corpos diretivos profissionais e independentes.
Na base desse novo movimento estão os grandes investidores institucionais, que pretendem proteger suas participações contra condutas inadequadas dos administradores. Aos excessivos poderes destes, coloca-se a barreira de um conjunto de pessoas competentes e compromissadas apenas em agregar valor à empresa.
Enquanto isso acontecia no âmbito internacional, o Brasil via surgir o seu capitalismo de Estado, com a criação das primeiras estatais na década dos cinqüenta. O fundamento era o de congregar na administração pública os recursos para promover a industrialização e, por via dela, o desenvolvimento econômico.
Quando chegamos à década de noventa, o espólio da ditadura militar se constituía de um enorme número de empresas controladas pela União, Estados e mesmo alguns municípios maiores, a grande maioria delas ineficientes. A privatização que se seguiu se desfez desses ativos e muitas dessas empresas estão hoje entre as mais negociadas em nossa bolsa e nas bolsas internacionais.
Também no Brasil a governança corporativa ganhou amplitude e se afirma cada vez mais como conjunto de regras que vieram para ficar. O maior exemplo disso é o Novo Mercado da Bovespa, que congrega empresas em que a governabilidade acontece com atendimento aos padrões internacionais de administração e exercício de poder societário.
A escolha de dirigentes ainda se dá por critérios políticos ou partidários e a administração se curva a “razões de Estado” |
Esse movimento, entretanto, ainda não alcançou as empresas estatais remanescentes negociadas em mercado. A escolha de seus dirigentes se dá por critérios na maioria das vezes políticos, algumas vezes até partidários e a sua administração se curva a “razões de Estado”, que impedem decisões que visem aumentar lucros e agregar valor ao investimento.
Esta é uma boa hora de as instituições de mercado, especialmente através de normas de auto-regulação, exigirem dessas empresas o atendimento das boas práticas internacionais de governança corporativa. Algumas sugestões para iniciar o debate:
• decisões de interesse apenas do acionista estatal, tal como vier a ser determinado em estatuto, devem ser também aprovadas pela maioria dos demais acionistas ordinários ou, eventualmente, preferenciais;
• todas as transações da empresa com entidades da administração pública, diretas ou indiretas, devem ser aprovadas pelo Conselho de Administração e ser objeto de notas explicativas dos auditores independentes, de forma a explicar o interesse da empresa em realizá-las;
• os membros do Conselho de Administração representantes do acionista estatal devem ser pessoas desvinculadas da administração pública e selecionadas em mercado, com pleno atendimento às exigências do cargo;
• os diretores devem ser escolhidos pelo Conselho de Administração também em mercado ou entre as pessoas da própria empresa, mas, neste último caso, submetidos a critério de seleção conduzida pelo próprio Conselho;
• as fontes de recursos provenientes de qualquer entidade da administração pública, diretas ou indiretas, devem ser apontadas e explicadas pelos auditores independentes, que devem medir o seu impacto nos resultados;
• ações detidas por fundações ou órgãos públicos devem ser equiparadas às do acionista estatal para todos os fins de exercício de poder e governança corporativa;
• aportes de capital pela administração pública devem ser legitimados pelas necessidades da empresa, sem diluição injustificada dos demais acionistas;
• pagamentos de dividendos devem ser justificados e apropriados diante dos planos de negócios da empresa.
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