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Lenha na fogueira

O presidente da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF), Gabriel Jorge Ferreira, está disposto a propor ao governo o fim de uma medida bastante controversa: o rodízio obrigatório das firmas de auditoria em bancos e empresas de capital aberto. Em consultas informais, Ferreira percebeu que grandes instituições financeiras são favoráveis a sua proposta. A Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca) também demonstrou apoio à idéia. Com isso, o executivo pretende abrir uma discussão com os agentes de mercado e representantes do governo para tentar acabar com o rodízio. “A liberdade do controlador para escolher seu auditor é o grande argumento defendido por nós, e há também a melhora no arcabouço legal nos últimos anos que precisa ser considerada”, afirmou Ferreira em entrevista à Capital Aberto.

A troca de auditores dentro dos bancos foi estabelecida em 1996 e passou a vigorar efetivamente a partir de 2001. No caso das companhias abertas, a introdução da regra foi feita pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) em 1999, quando lançou a Instrução 308. O rodízio, na prática, começou a ser feito pelas empresas em 2004. Nos dois momentos, as discussões entre os favoráveis à medida e os que a condenam foram bastante acaloradas, com argumentos razoáveis de ambos os lados. Acabou prevalecendo a decisão da autarquia.

Na avaliação do presidente da CNF, o cenário em que a regra foi estabelecida para os bancos e as companhias abertas difere bastante do quadro atual. Quando o Banco Central resolveu exigir a troca dos auditores nas instituições financeiras, o País tinha acabado de passar por um ruidoso processo de intervenção em diversos bancos, como Econômico, Nacional e Bamerindus. “Vivemos atualmente um clima muito melhor em matéria de qualidade de governança”, argumenta Ferreira.

No entender do executivo, o próprio Banco Central ampliou e qualificou sua equipe de supervisão das instituições. “Naquela época, o BC não dispunha de uma supervisão com a qualidade que tem hoje”, diz. Segundo Ferreira, a fiscalização atualmente é feita em bases consolidadas, com uma inspeção mais detalhista das carteiras das instituições e dos sistemas de controles. “Além disso, tivemos um aumento na responsabilidade dos auditores”, argumenta. A Instrução 308 passou a exigir, entre outras medidas, processos mais rigorosos de qualificação do auditor e a revisão dos seus trabalhos pelos pares – uma espécie de supervisão por firmas concorrentes para prevenir desvios de conduta.

Apesar dessas melhorias, muitos defendem que o rodízio das auditorias seja mantido. É o caso do ex-presidente da CVM e atual sócio da gestora de recursos Jardim Botânico Partners, José Luiz Osório. “O mecanismo é uma proteção adicional, com uma relação custo/benefício favorável, que deve ser utilizada”, afirma. Na opinião de Osório, o rodízio garante ao Banco Central e à CVM proteção à principal matéria-prima do investidor: a informação sobre a companhia.

Para o presidente da Abrasca, Alfried Plöger, a adoção do rodízio nas companhias abertas ocorreu em caráter preventivo, diante do medo de se repetir no Brasil casos emblemáticos como o da Enron nos Estados Unidos. Entretanto, ele considera um erro a comparação, e por tabela, a adoção da medida. O argumento de Plöger é relativamente simples. Nos Estados Unidos, o controle das companhias não é definido e concentrado como no Brasil. O capital das empresas é bastante pulverizado e a remuneração fixa dos administradores é baixa, uma vez que boa parte de seus ganhos vêm da valorização das ações da companhia listada em bolsa. “No Brasil, o controle é claro e definido, os resultados da companhia são minimizados para fugir do imposto de renda e não há tanta remuneração vinculada às ações em bolsa. Portanto, não há razão para que haja um conluio entre os diretores, os conselheiros e o auditor como ocorreu lá fora”, pondera.

Além da melhora na qualidade do trabalho de supervisão do BC, Gabriel Jorge Ferreira ressalta que os avanços na governança corporativa são mais um motivo para acabar com o rodízio obrigatório de auditores. Ele cita também as medidas adotadas pelo Conselho Federal de Contabilidade, como o programa de certificação continuada dos auditores e a exigência de rodízio das equipes seniores das auditorias a cada cinco anos.

Mas a linha mestra do argumento de Ferreira ainda é a liberdade do acionista controlador. “O rodízio obrigatório representa uma interferência na liberdade do acionista de contratar o auditor que entenda mais adequado”, afirma. “Na medida em que há uma obrigação (de trocar o auditor), ocorre uma interferência do Estado nesse direito”, conclui.

A idéia de Ferreira ainda não foi formalizada às autoridades competentes, nem foi levada a discussão no colegiado da CNF ou da CVM. Mas o assunto já foi colocado, informalmente, ao diretor de Normas do Banco Central, Sérgio Darcy. À primeira vista, a resposta do diretor foi a padrão. “Não senti uma reação negativa. Há espaço para análise e discussão. Darcy tem uma visão correta do mercado, debate muito e tem divulgado projetos importantes”, disse Ferreira, ao comentar a conversa com o diretor do BC.

Por enquanto, o Banco Central mantém-se fortemente favorável ao rodízio obrigatório. Segundo uma importante fonte do BC, as portas estarão sempre abertas para a discussão de temas desta natureza. Entretanto, para que o debate possa avançar, é preciso que os defensores do fim do rodízio apresentem “subsídios concretos”.

Para dar um formato mais oficial à proposta, Ferreira pretende realizar um grande debate nos próximos meses. “A idéia é envolver órgãos reguladores, companhias abertas, entidades de classe, grandes especialistas de auditoria e contabilidade”.

Mas a expectativa de um parecer objetivo sobre o assunto pode ir por terra. Sempre que discutido, o tema atrai discursos acalorados de ambos os lados e poucas conclusões. Independentemente do resultado da proposta, a idéia de Jorge Ferreira tem garantia de ser bem sucedida em pelo menos um quesito: voltar a por lenha na fogueira.


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