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Conciliação de poderes
Adaptações para escolha do auditor externo vão exigir jogo de cintura das companhias

Imagine que um prestador de serviços extremamente relevantes para uma empresa tenha seu trabalho acompanhado de perto por uma equipe supercapacitada e formada especialmente para isso. Além de avaliar a qualidade e confiabilidade deste serviço regularmente, o grupo orienta, faz cobranças e encaminha suas demandas. No entanto, se julgar necessário dispensar esse prestador de serviços, ou escolher outro para o seu lugar, estará de mãos atadas: pode, no máximo, fazer uma recomendação nesse sentido e torcer para que a sua avaliação seja considerada.

A situação acima pode descrever a circunstância de funcionamento do comitê de auditoria – ou conselho fiscal adaptado às suas funções – no relacionamento com os auditores externos. Enquanto na lei americana Sarbanes-Oxley (SOX) o poder de contratar e destituir auditores e determinar a política de prestação de serviços de não-auditoria está nas mãos do comitê, que tem total autonomia na decisão, no Brasil essa autoridade é atribuída legalmente ao conselho de administração.

O relacionamento entre os dois órgãos – o que acompanha o auditor e o que tem poderes sobre ele – pode ficar ainda mais difícil nas companhias que optaram pelo conselho fiscal para atender às exigências da SOX. Teoricamente, o comitê de auditoria faz parte do conselho de administração, atuando como um braço seu, enquanto o conselho fiscal funciona separadamente.

Então a opção das empresas pelo comitê de auditoria vai facilitar a convivência com os auditores externos, certo? Não necessariamente. Uma outra ponte de relacionamento terá que ser construída de qualquer forma, no caso de existir o conselho fiscal – uma legítima instância de fiscalização dos acionistas minoritários, que podem solicitar a instalação do órgão anualmente e eleger um representante com poder de vetar o nome do auditor externo escolhido pelo conselho de administração.

Os desencontros entre as leis brasileira e americana foram um dos motivos para que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) solicitasse que a Securities and Exchange Commission (SEC) aceitasse a substituição do comitê de auditoria pelo conselho fiscal brasileiro, previsto na lei desde 1976. “Mostramos que o comitê de auditoria não poderia nomear diretamente o auditor externo e estaria sujeito a veto do conselheiro dos minoritários”, conta Luiz Leonardo Cantidiano, presidente da CVM na época, ressaltando que o veto sempre tem que ser embasado.

Em tese, o conselho de administração é livre para escolher sua auditoria externa. Na prática, porém, o órgão costumava referendar uma opção da diretoria da empresa. Agora, dentro do conceito da SOX de separação entre gestão e fiscalização, o referendo deve vir para uma recomendação do comitê de auditoria ou do conselho fiscal “turbinado”. O compromisso de seguir a recomendação do órgão que estiver de fato acompanhando o dia-a-dia da auditoria externa tem sido declarado pelos conselhos de administração das companhias submetidas à SOX, e também foi expresso no regimento interno de muitos comitês de auditoria e conselhos fiscais adaptados.

“Colocamos no regimento do conselho fiscal a atribuição de fazer uma recomendação formal sobre os auditores externos para o conselho de administração, que está delegando essa escolha”, conta Leonardo Pereira, diretor de Relações com Investidores (RI) da Net Serviços. Além disso, um membro do conselho fiscal foi destacado para fazer a ligação com o conselho de administração, evitando problemas de comunicação e melhorando este relacionamento.

Para os consultores, porém, apenas a prática vai “azeitar” estas relações, que estão começando a ser travadas. As políticas em relação à pré-aprovação de serviços prestados por auditores externos indicam que esta ponte ainda terá que ser construída em muitas empresas, como mostra a pesquisa feita pela consultoria Hirashima & Associados com base nos relatórios 20-F das companhias com registro no mercado de capitais americano.

Pela seção 201 da SOX, os serviços de não-auditoria devem ser pré-aprovados pela estrutura designada para atender à seção 301, que determina a instalação do comitê de auditoria ou equivalente. Apesar disso, nos relatórios enviados até julho à SEC, 56% das empresas afirmaram que a lista de serviços pré-aprovados era responsabilidade do conselho de administração, 34% do comitê de auditoria e 10% do conselho fiscal adaptado.

TEMPO PARA ADEQUAÇÃO – O interesse na aproximação entre o conselho de administração e o conselho fiscal turbinado existe de ambas as partes, já que, pelas leis brasileira e americana, todos poderão ser responsabilizados por eventuais fraudes ou condutas inadequadas. “Com o tempo, o conselho fiscal vai ganhar a confiança do conselho de administração para fornecer as recomendações”, prevê Bruce Mescher, sócio da área de auditoria da Deloitte Touche Tohmatsu. Ele acredita, entretanto, que no curto prazo a escolha do auditor externo continuará a ser uma atribuição do conselho de administração.

O conselho fiscal adaptado também vai buscar um alinhamento com o conselho de administração, para compensar o fato de não ter os mesmos poderes do comitê de auditoria previsto na lei americana. “Quem realmente tem condições de avaliar os serviços do auditor externo é o conselho fiscal (adaptado)”, diz Taiki Hirashima, diretor da Hirashima & Associados.

No caso do comitê de auditoria, não é diferente. As empresas que adotaram o formato americano conhecem as limitações impostas pela lei brasileira no caso da contratação da auditoria externa, e trataram de estabelecer um procedimento para dar confiança aos investidores sobre a eficácia do sistema híbrido de responsabilidades e poderes. “O conselho de administração da Petrobras contratará a auditoria externa após a recomendação do comitê de auditoria”, explica Raul Campos, diretor de RI da estatal. “Além disso, haverá uma troca de permanente de informações com o conselho fiscal, estruturado de acordo com a legislação brasileira.

Expectativa é que, no curto prazo, a definição do auditor continue sob responsabilidade do conselho de administração

O comitê de auditoria formado pela Copel para atender à SOX vai não apenas participar do processo de escolha da auditoria externa, como opinar sobre os seus honorários, conta Laurita Costa Rosa, expert financeira e presidente do comitê. Ela admite que, no primeiro momento, podem ocorrer conflitos de competência entre o comitê de auditoria e o conselho fiscal, mas ressalta que este relacionamento já está previsto nos regimentos internos dos dois órgãos. “Teremos reuniões bimestrais conjuntas”, diz Laurita. “A fiscalização sairá fortalecida e isso vai trazer a maior credibilidade que a empresa procura.”

Enquanto o desejado alinhamento entre os diferentes órgãos de fiscalização vai sendo construído, as empresas buscam compatibilizar as exigências das leis americana e brasileira de forma transparente, explicitando os procedimentos adotados em relação à auditoria externa. Mas tudo indica que o caminho já está traçado: o órgão que controla a auditoria também deve nomeá-la, contando com o referendo do conselho de administração.


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