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A parte esquecida da Sarbanes-Oxley
Executivos devem atentar para os artigos menos famosos mas igualmente severos impostos pela lei

Quase uma década após o Chicago Bulls ter ganho seis campeonatos da NBA nos anos 90, quase todos se lembram do Michael Jordan. Mas e quanto a Scottie Pippen, Bill Cartwright e John Paxson? Isto seria como se lembrar apenas de Romário e esquecer-se de que Bebeto e Branco também fizeram parte da vitória da Copa de 1994. Menos conhecidos, talvez, mas não menos importantes.

Em termos de Sarbanes-Oxley, três anos após sua promulgação, as companhias afetadas pela lei já conhecem bem os novos itens de divulgação do formulário 20-F, as exigências sobre conselhos fiscais ou os requisitos de certificação dos artigos 404, 302 e 906. No entanto, a lei tem outros artigos – aproximadamente 70 – que não são menos importantes, mas podem facilmente passar despercebidos. Vamos tratar aqui de alguns dos mais relevantes entre os artigos “esquecidos”.

CÓDIGO DE ÉTICA – Os emissores se lembrarão que, segundo o artigo 406 da Sarbanes-Oxley, é necessário divulgar se a companhia adotou ou não um código de ética para sua diretoria e conselheiros. Se não o fez, é preciso explicar o motivo. Até aqui, tudo bem.

Entretanto, as regras também exigem que a companhia divulgue qualquer isenção da aplicação do código de ética, explícita ou implícita, que beneficie um diretor ou conselheiro. Essa divulgação deve incluir a natureza da isenção, o nome da pessoa para quem a companhia a concedeu e a data. As regras definem o termo “isenção” (ou waiver, em inglês) como a aprovação, pela companhia, de uma infração significativa do código de ética. E definem “isenção implícita” como a omissão perante uma infração significativa de uma disposição do código de ética dentro de um período de tempo razoável. A companhia deve divulgar quaisquer destas isenções no seu formulário 20-F anual.

REVISÃO DE RELATÓRIOS – Os emissores sabem que seus relatórios registrados na Securities and Exchange Commission (SEC) – tais como o formulário 20-F – podem ser selecionados para revisão pela equipe da comissão. No passado, essa revisão não era sistemática; uma companhia podia registrar seus relatórios durante muitos anos sem nunca passar por uma revisão. No entanto, como resultado da Sarbanes-Oxley, a SEC deve agora rever as divulgações feitas pelas companhias registradas pelo menos uma vez a cada três anos. Naturalmente, a empresa pode não saber se a SEC examinou seus relatórios – ela pode ter olhado o último 20-F sem ter emitido nenhum comentário – mas os emissores devem estar atentos ao fato de que a comissão analisará os relatórios com mais freqüência.

Executivos envolvidos no processo de registro inicial junto à comissão lembram-se dos comentários recebidos da SEC durante a revisão da minuta de sua declaração de registro (registration statement), do formulário F-1 ou do 20-F, bem como das respostas que encaminharam à agência. As companhias devem estar conscientes de que, desde 1 de agosto de 2004, a SEC disponibiliza, pública e prontamente, todas as correspondências desta natureza feitas após esta data. Investidores, principalmente os descontentes, agora têm pronto acesso à análise da SEC sobre seus relatórios. Os emissores devem ter em mente que essas correspondências podem envolver divulgações inadvertidas ou duras críticas por parte da equipe da SEC, o que dá às companhias mais um motivo para cuidadosamente preparar seu 20-F anual.

NOTIFICAÇÃO DOS ADVOGADOS – Conforme exigência do artigo 307 da Sarbanes-Oxley, a SEC adotou regras relativas à conduta dos advogados. Parte dessas regras exigem que esses profissionais, inclusive aqueles de consultoria jurídica externa, relatem de forma “escalonada” aos diversos níveis hierárquicos da companhia, começando pelo diretor jurídico e/ou presidente da companhia, quaisquer provas de violação significativa das leis estaduais americanas ou das leis federais americanas referentes a valores mobiliários que eventualmente encontrarem, ou de violação significativa de obrigações fiduciárias pela companhia (inclusive por parte de seus diretores, conselheiros, empregados e agentes). Se o advogado não receber uma resposta apropriada, deve informar o comitê de auditoria do conselho de administração ou um conselho independente responsável pelo cumprimento das leis, se houver. A norma isenta advogados que não sejam norte-americanos e não exerçam a profissão sob as leis norte-americanas de títulos e valores mobiliários.

Mas, e depois? O que o advogado deve fazer se não ficar satisfeito com a resposta da companhia? Segundo as regras da SEC originalmente propostas, ele estaria obrigado a renunciar à representação da companhia, notificando-a por escrito de que está tomando essa atitude devido a “questões profissionais”. A companhia estaria então obrigada a divulgar a renúncia em seus relatórios junto à SEC. A agência, contudo, não adotou essa parte das regras, pelo menos por enquanto. Mas a TV Azteca é um exemplo do que aconteceria se ela fosse adotada da forma proposta.

Companhia mexicana listada na Bolsa de Nova Iorque (a Nyse), a TV Azteca foi, de acordo com a representação da SEC, repetidamente aconselhada por consultores jurídicos externos a divulgar nos seus relatórios que o diretor- presidente estava pessoalmente envolvido em transações relevantes com a companhia. Como a TV Azteca recusou-se reiteradamente a fazer a divulgação, o escritório de advocacia renunciou ao mandato. O escritório explicou em memorando confidencial à administração da companhia que a renúncia era consistente com a sua obrigação de fazer uma notificação “escalonada”, segundo o artigo 307 da Sarbanes-Oxley.

Entretanto, o memorando “vazou” para o The New York Times, o que levou a uma investigação por parte da SEC e deu início a uma ação judicial contra a companhia e três de seus funcionários, incluindo o diretor-presidente. Como acontece freqüentemente nos Estados Unidos, poucos dias após o anúncio da SEC acionistas protocolaram ações coletivas contra a TV Azteca. Em junho, a TV Azteca cancelou a listagem de suas ações na Nyse.

PROIBIÇÃO DE EMPRÉSTIMO A DIRIGENTES – O artigo 402 da Sarbanes-Oxley e a correlata seção 13k do Exchange Act proíbem as companhias registradas na SEC de conceder, direta ou indiretamente, empréstimos pessoais a seus conselheiros ou executivos. Tal proibição levanta uma série de questões delicadas. Por exemplo, as companhias precisam avaliar cuidadosamente se qualquer aspecto de seus programas de remuneração de executivos pode ser caracterizado como empréstimos, tais como os programas que oferecem o exercício de opções de ações sem contraprestação em dinheiro (cashless stock options).

Notadamente, os bancos – inclusive aqueles com sede fora dos EUA – estão isentos da norma desde que o empréstimo seja efetuado no curso normal das atividades de crédito ao consumidor do banco, do tipo que o banco geralmente coloca à disposição do público. O empréstimo não deve ter condições diferenciadas em relação àqueles oferecidos ao público.

PROCEDIMENTOS E CONTROLE DE DIVULGAÇÃO – Para as companhias que registraram seu formulário 20-F em junho, as certificações no artigo 302 – onde o presidente e o diretor financeiro atestam os controles e procedimentos de divulgação da companhia – não são um mistério. Mas as ações da SEC em relação às políticas de divulgação precisam ser melhor entendidas.

Na esteira da aprovação da Sarbanes-Oxley, a SEC adotou uma abordagem agressiva e, também, inovadora. Em junho de 2004, acusou a Siebel Systems e alguns de seus principais diretores de violação da regra 13a-15 por não cumprimento das exigências de divulgação dadas pela regulação Fair Disclosure (FD). A regra 13a-15, aprovada segundo a Sarbanes-Oxley, exige que as companhias mantenham procedimentos e controle de divulgação adequados. Embora a regulação FD não se aplique, por seus termos, a companhias de fora dos EUA, o caso da Siebel é um sinal de que a SEC poderá acionar as estrangeiras e seus principais executivos se a companhia falhar em detectar divulgações inadequadas.

CONTRATAÇÃO DE EX-AUDITORES – O Congresso norte-americano avaliou que muitos dos escândalos contábeis do final da década de 90 decorreram do estreito relacionamento entre os emissores e seus auditores externos. Isso levou, por meio da Sarbanes-Oxley, ao endurecimento das regras aplicáveis à independência do auditor, particularmente com relação ao trabalho que esses profissionais podem realizar em nome da companhia.

Talvez o ponto menos lembrado seja o que diz respeito às restrições que agora as companhias enfrentam para contratação de ex-funcionários de escritórios de auditoria que trabalharam para a companhia. Igualmente, as firmas de auditoria não poderão auditar um emissor caso um executivo dessa companhia tenha sido funcionário do escritório de auditoria no período de um ano anterior ao início dos trabalhos.


E O TAFFAREL? – As regras que afetam as companhias sujeitas à Sarbanes-Oxley parecem infindáveis. Mais de um diretor financeiro já declarou que não se sente mais trabalhando para a sua companhia, mas sim para a SEC. Imediatamente após o registro do formulário 20-F e a revisão dos controles internos segundo o artigo 404, alguns diretores podem sentir-se tentados a esquecer ou ignorar os demais artigos da lei, entre os quais apenas uma pequena parte foi aqui mencionada. Resista à tentação. Embora algumas provisões chamem mais atenção do que outras, as companhias sujeitas às regras têm de cumprir todas elas. Para se inspirar, pense em Taffarel no Rose Bowl em 1994 enfrentando os pênaltis dos italianos. Após dois gols, ele desistiu ou defendeu até o fim?


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