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Indústria aquecida
Ratings, relatórios, softwares e cursos... crescem as oportunidades de negócios para quem quer pegar carona na onda da governança corporativa

ed15_032-035_pag_2_img_001O orçamento das empresas para 2005 promete incluir um investimento recorde em governança corporativa. De olho nessas verbas, que são definidas no final do ano, dezenas de fornecedores de produtos e serviços relacionados a modernas práticas corporativas se mobilizam para lançar novidades e suprir as demandas das companhias. Essa verdadeira indústria da governança inclui de pequenas firmas de contabilidade a gigantes da Tecnologia da Informação (TI), passando por empresas de consultoria, auditoria, comunicação, rating e treinamento.

Na procura pelo software mais eficiente para adequar seus controles internos às exigências da lei americana Sarbanes-Oxley, ou pelo melhor relatório anual para impressionar os investidores, algumas companhias preferem não economizar. “Conversei com dez empresas nos últimos dias e oito afirmaram que não tomariam sua decisão baseada em preço”, diz Rodrigo Guimarães, gerente de projetos de relatórios anuais da Selulloid AG, que ganhou quatro dos oito prêmios da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca) este ano e cobra de R$ 90 mil a R$ 300 mil por relatório, muitos com balanços sociais destacados.

A disputa por clientes é acirrada, reconhece Guimarães, mas o crescimento de 50% na área de relatórios este ano indica que a Selulloid estaria trilhando o caminho certo. Ter a governança como cartão de visitas é tão importante que as empresas começam a buscar certificações e participar de rankings de boas práticas. Os ratings de governança já são feitos por agências de classificação de risco e começam a ser oferecidos por consultorias especializadas, como a Excelência Governança Corporativa. “Fazemos a avaliação baseada em 178 quesitos e damos a certificação. Esse produto é a nossa grande aposta”, diz o diretor Thomas Felipe.

A hora de prospectar clientes é agora, ensina Rodolfo Zabisky, diretor executivo da MZ Consult, que presta consultoria na área de Relações com Investidores (RI) e acaba de lançar um produto inédito, denominado “Divulgação Exemplar”, em parceria com o escritório Linklaters, especializado em mercado de capitais nos Estados Unidos, e a consultoria KPMG. “Outubro e novembro são os melhores meses para lançar um produto, porque é quando as empresas colocam a governança no orçamento”, explica Zabisky, que estima um custo entre R$ 30 mil e R$ 50 mil para companhias que aderirem aos novos processos de divulgação de informações ao mercado, incluindo certificação.

Pela experiência das prestadoras de serviços que exploram o filão, a governança de fato saiu do discurso e entrou no planejamento das companhias. O diretor da MZ lembra que, na área de RI, a primeira onda foram os websites, que alavancaram o faturamento de sua empresa. “Agora será a vez das políticas e processos de divulgação de informações”, aposta Zabisky. Na implementação de manuais de boas práticas, já houve o boom dos códigos de ética, recordistas de projetos na KPMG no ano passado, recorda-se André Coutinho, diretor de Management Assurance Services da consultoria.

Uma pesquisa eletrônica feita pela KPMG em abril com 53 conselheiros e diretores de empresas, à qual a Capital Aberto teve acesso com exclusividade, aponta para os maiores investimentos já realizados em relação a processos e práticas de governança. No ano passado, 55% das companhias apostaram no fortalecimento da auditoria interna, 48% na área de gerenciamento de riscos e 44% implementaram códigos de boas práticas. Novas tecnologias para monitorar o desempenho foram adotadas por 35% das empresas, enquanto 30% investiram na melhora do treinamento e na formação de membros da diretoria. O fortalecimento da área de RI e o aprimoramento dos relatórios anuais foram itens apontados por 27% dos entrevistados.

OTIMISMO PARA 2005 – Tudo indica que os investimentos se intensificaram este ano e devem explodir no próximo. As previsões otimistas da indústria da governança levam em conta alguns fatores. O primeiro deles é a pressão dos prazos impostos para adequação às exigências da Sarbanes- Oxley, que se esgotam em julho de 2005 para as empresas com ações na Bolsa de Nova York, e, no final deste ano, para as subsidiárias brasileiras de multinacionais americanas. A principal preocupação, neste caso, é com a seção 404 da lei, que exige uma série de procedimentos relativos a controles internos, um dos pontos nevrálgicos da Sarbanes-Oxley que visa evitar fraudes e permitir a responsabilização dos executivos pela gestão financeira das empresas.

Como nicho de mercado a explorar, o universo de companhias com ADRs e subsidiárias que eventualmente não tenham trazido pronto o “pacote” de novas práticas da matriz parece restrito. Mas a previsão da indústria da governança é de que as empresas que escapam das exigências da Sarbanes tenderão, cada vez mais, a adotar os princípios da lei, seja por uma questão de competitividade ou para corresponder às expectativas de clientes e potenciais investidores. Vale lembrar que, com o revigoramento do mercado de capitais no País, várias empresas hoje começam a estudar a abertura de capital e as captações no exterior – e só então percebem que o seu nível de transparência está anos-luz aquém do requerido pelos órgãos reguladores. É aí que o mercado se amplia de forma extraordinária para a governança, com espaço até para consultorias de menor porte que vislumbrem nichos inexplorados.

Expectativa é de que empresas não sujeitas às exigências da Sarbanes-Oxley adotem os princípios da lei para manter padrão de competividade

“Temos como clientes fornecedores da Petrobras, que estão sendo cada vez mais exigidos. Os balanços auditados já são obrigatórios”, conta Antonio Ranha, sócio da BKR-Lopes, Machado, empresa que está entre as maiores de auditoria mas costuma ficar de fora da disputa pelas grandes contas, restritas às “Big Four” do setor – Deloitte, PricewaterhouseCoopers, Ernst & Young e KPMG. “Empresas familiares e de médio porte descobriram a governança como forma de maximizar resultados”, diz o diretor da BKR, que acaba de contratar dois funcionários para ampliar o departamento de consultorias especiais e assessoria de gestão, depois de detectar um aumento de 18% na demanda por este tipo de trabalho.

Nas grandes consultorias e empresas de auditoria, os projetos multiplicam-se e ganham sofisticação. André Coutinho, da KPMG, conta que este ano está explodindo a demanda por projetos de adequação à Sarbanes-Oxley, seguidos pelos de auditoria interna, que cresceram 50% em relação a 2003. Coutinho ressalta que as empresas podem buscar as melhores práticas de governança sem o apoio de consultorias, mas acabam esbarrando na principal barreira apontada por pesquisas para a sua implantação: a necessidade de mudança de cultura. “As empresas precisam de uma espécie de intermediação para definir papéis e responsabilidades dentro da organização, formar comitês, fazer treinamentos e avaliar o próprio conselho de administração”, diz o executivo, citando alguns dos produtos oferecidos pela própria KPMG.

O desafio mais urgente, porém, é implantar controles internos eficazes para garantir a adequação à Sarbanes. A correria no mercado americano, onde o prazo chegou a ser prorrogado, mostrou que essa implantação, que inclui testes e monitoramento, é bem mais complexa do que parece inicialmente. A KPMG acredita que a pressa fará com que as companhias, neste primeiro momento, se atenham apenas ao cumprimento da lei, optando até por procedimentos manuais, para só numa segunda etapa (depois de julho de 2005) buscar a eficiência nos processos, com maiores investimentos em tecnologia.

“A contabilidade nunca foi tão importante e complexa como agora, mas a maioria das empresas continua trabalhando com a mesma ferramenta dos anos 70: a planilha”, diz Antonio Coló, presidente da SCA Systema Consultores Associados, consultoria especializada em processos e sistemas financeiros. Ele reconhece que a tecnologia muitas vezes não consegue acompanhar a velocidade das mudanças das normas aplicadas nos últimos tempos e que o Excel ganha preferência pela flexibilidade. Mas diz que alguns dos novos padrões internacionais de contabilidade, previstos pelo International Financial Reporting Systems (IFRS), são simplesmente impossíveis de serem seguidos sem um software mais sofisticado. “É improdutivo e inseguro”, afirma Coló.

A empresa é uma das que crescem graças às novas demandas na área contábil e de controladoria. Desde 2001, segundo Coló, o faturamento vem crescendo 50% ao ano e as perspectivas são ainda melhores daqui para frente. “O produto já não é novidade e continua sendo um sucesso, o que mostra a maturidade do mercado. Com a Sarbanes, 2005 será o ano do pânico, do rebuliço”, prevê.

SOLUÇÕES TECNOLÓGICAS – Outras empresas apostam em grandes lançamentos para disputar os clientes. A PeopleSoft, segunda maior em software empresarial no mundo, está apresentando ao mercado o PeopleSoft Internal Controls Enforcer como a primeira solução capaz de automatizar a execução de todos os controles internos. O produto foi feito sob medida para atender às exigências da seção 404: além de documentar processos e monitorar controles, promete alertar a administração para mudanças e reforçar o cumprimento das responsabilidades em vários níveis da organização. O leque de clientes potenciais deve aumentar no médio prazo, acredita Adalberto Ribeiro, consultor de negócios da empresa. “Os parceiros comerciais terão que ser gerenciados da mesma forma”, aposta.

A IBM, líder mundial em TI, fez uma pesquisa com 90 executivos financeiros dos Estados Unidos em que os entrevistados consideraram o gerenciamento de dados, a infra-estrutura de TI e questões de responsabilização sobre processos os maiores desafios para o cumprimento da legislação americana. A própria IBM Brasil passa por um processo de adequação, assim como outras subsidiárias de multinacionais americanas. Apesar de não precisarem de consultorias, pois apenas implementam os projetos da matriz, em geral necessitam do apoio de auditorias para a fase de testes.

Os produtos oferecidos pela IBM Business Consulting Services vão desde o gerenciamento de todo o projeto para o cumprimento de novas regulamentações (além de Sarbanes, também é oferecida adequação ao Acordo da Basiléia II, que trata dos riscos operacionais de instituições financeiras) até o reparo de falhas, explica Leandro Negreiros, responsável pela área de Financial Management. O esforço pode demandar de 12 mil a 15 mil horas de consultoria. Além de oferecer softwares de documentação e acompanhamento dos testes, a empresa desenvolve atualmente quatro projetos de gerenciamento. “Acredito que a demanda das empresas vai duplicar no próximo ano”, diz Negreiros.

IBM e KPMG, assim como outras consultorias, preferem não fazer estimativas de custos, que variam de acordo com o porte e a pretensão dos projetos. Por conta da falta de conhecimento técnico e da cultura de boas práticas dentro das empresas, uma das principais demandas é por treinamento – segmento que também está movimentando o setor de ensino especializado em negócios.

GOVERNANÇA EM SALA DE AULA – A Fundação Dom Cabral, pioneira em programas destinados a acionistas de empresas familiares e treinamento de conselheiros, criou há seis meses um Núcleo de Estudos de Governança Corporativa, coordenado pela professora Elizmar Álvares. “Para as empresas familiares, que são a maioria no País, a governança é, antes de tudo, uma forma de romper com a cultura da propriedade e evitar problemas sucessórios”, diz a coordenadora. Depois de oferecer treinamentos em Minas Gerais, onde fica a fundação, e São Paulo, a Dom Cabral preparase para abrir em março turmas em Porto Alegre e Santa Catarina.

O Ibmec de São Paulo também tem planos ambiciosos. A partir do próximo ano, a escola vai oferecer no MBA executivo uma disciplina denominada Teoria Organizacional e Governança Corporativa, além de criar um curso específico sobre governança, com carga horária entre 100 e 120 horas. “A demanda partiu dos próprios alunos”, conta André Duarte, coordenador do MBA executivo do Ibmec. Alunos que trabalham em grandes empresas estão observando a abertura de vagas atraentes em conselhos de administração e comitês de auditoria, por exemplo. Pelo visto, as boas práticas de governança aquecem não só a “indústria” formada ao seu redor como o mercado de executivos – uma boa notícia em tempos de empregos escassos.


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