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A hora e a vez dos comitês de auditoria
Companhias se movimentam para adaptar estruturas, encontrar os profissionais certos e utilizar os serviços do comitê em favor de ganhos gerenciais

ed15_022-026_pag_3_img_001Um seleto grupo de executivos renomados e experientes, especializados na área financeira e com reputação acima de qualquer suspeita, está sendo disputado para integrar comitês de auditoria de empresas, especialmente das companhias brasileiras com American Depositary Receipts (ADRs). A corrida por executivos qualificados, que deve acirrar-se nos próximos meses, é o sinal mais visível de que os comitês afinal deslancharam no Brasil – embora ainda careçam de estruturas mais eficazes.

O assunto ganha destaque a cada dia no ambiente corporativo. As empresas brasileiras listadas na Bolsa de Nova York chegaram a ser liberadas da obrigatoriedade de formar os comitês, prevista pela lei americana Sarbanes-Oxley para vigorar a partir de julho de 2005. Concebidos como peça-chave da nova legislação que pretende evitar as fraudes contábeis que abalaram o mercado americano, os comitês poderão ser substituídos, com certas adaptações, pelos conselhos fiscais, segundo uma autorização da Securities and Exchange Commission (SEC) obtida pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Mas as primeiras avaliações são de que, apesar da colher de chá, os comitês de auditoria vão se sobrepor aos conselhos fiscais.

Como o prazo para a adaptação à Sarbanes- Oxley ainda não se esgotou, e muitas companhias estão debatendo internamente o assunto, é cedo para decretar a opção maciça pelos comitês. Mas, na percepção do mercado, a preferência é por corresponder aos anseios dos investidores – mais afeitos à padronização de regras do que a compreender peculiaridades locais. Outro fator que pode ter pesado na decisão das empresas é o exemplo dos bancos, que estabeleceram seus comitês em julho deste ano, por determinação do Banco Central (BC).

Os comitês de auditoria passaram a ser vistos de forma tão positiva que algumas grandes empresas não subordinadas às regras da Sarbanes- Oxley e nem às Resoluções nº 3.081 e 3.170 do BC (aplicáveis a bancos com patrimôed15_022-026_pag_4_img_001nio de referência igual ou superior a R$ 1 bilhão) resolveram incluir a sua formação na estratégia de governança corporativa. Em uma pesquisa sobre gerenciamento de riscos e governança corporativa realizada no segundo semestre do ano passado com 250 grandes empresas, 41% afirmaram ter um comitê de auditoria instalado e 21% avaliavam a sua constituição. Outras 38% não possuíam comitês.

Entre as companhias com o comitê em funcionamento, cerca de 40% reconheciam ser necessário intensificar sua participação, enquanto 60% qualificaram a estrutura como atuante. A KPMG, responsável pelo estudo, vem aprofundando o tema este ano em mesas redondas promovidas pelo Audit Committee Institute (ACI), lançado no Brasil em março, depois de ser implantado pela consultoria em outros dez países.

EM FASE DE ADAPTAÇÃO – Além de acalorados debates e muita troca de informações, os três encontros já realizados produziram uma singular base de dados sobre a experiência das empresas que estão mais adiantadas na implantação dos comitês e a opinião dos executivos envolvidos no processo. Uma pesquisa eletrônica realizada durante os dois primeiros eventos, em abril e julho, divulgada com exclusividade para a Capital Aberto, mostra que ainda será preciso percorrer um longo caminho até os comitês de auditoria atingirem seus objetivos e se enquadrarem nas determinações da lei americana.

O primeiro desafio refere-se à sua composição e aos quesitos para independência. Segundo a Sarbanes, é exigida uma série de qualificações por parte dos membros – que devem ser no mínimo três, todos independentes e pelo menos um deles “expert” em finanças e contabilidade. Para atender rigorosamente a lei americana, uma das dificuldades é encontrar, entre os membros do conselho de administração – do qual é extraído o comitê – pessoas que atendam a todos os pré-requisitos. Não é permitido qualquer vínculo com a sociedade, exceto eventual participação minoritária no capital. As normas excluem ex-diretores, empregados de empresas de auditoria prestadoras de serviços e parentes até segundo grau de membros do grupo de controle, por exemplo. Para as brasileiras que optarem pelo conselho fiscal, uma das facilidades está justamente na questão da independência. A SEC decidiu que poderão prevalecer os parâmetros estabelecidos pela Lei das S.A.

Pesquisa da KPMG mostra que apenas 20% dos comitês de auditoria estão completamente adequados aos critérios de independência e capacidade técnica

Na segunda mesa de debates da ACI, dos 69 participantes apenas 20% declararam que os membros do comitê de auditoria de sua empresa estavam completamente adequados aos critérios de independência e capacidade técnica. A maior parte afirmou que a adequação era parcial (38%) ou necessitava de melhorias (31%), enquanto 11% avaliaram o comitê como em completo desacordo com essas exigências.

Em muitos casos, os comitês foram estruturados por conselheiros que agora se preparam para deixálos, justamente por não atenderem aos desejados critérios de independência. “Foram nove meses de aprendizado”, diz Ramon Perez, membro fundador do comitê de auditoria da CPFL Energia e diretor financeiro da VBC, grupo acionista da CPFL. “O comitê precisa começar a funcionar para encontrar o seu papel e aprender a se relacionar com o conselho fiscal. Teremos que fazer ajustes em relação à independência dos membros. Um dos maiores desafios será a composição.”

SOBREPOSIÇÃO DE FUNÇÕES – Na prática de trabalho, o comitê da CPFL, composto por três conselheiros com experiência em auditoria e um especialista financeiro, logo descobriu o motivo pelo qual algumas empresas preferiram adaptar o seu conselho fiscal às novas tarefas de auditoria: a sobreposição de funções. Perez conta que, nas primeiras reuniões, ficou claro que debruçar- se em análises das demonstrações financeiras seria perda de tempo, já que este trabalho havia sido feito pelo conselho fiscal. “Agora fazemos análises sobre assuntos pontuais, além de outras tarefas previstas no regimento, como gestão da auditoria interna e contratação da auditoria externa”, diz o executivo.

“O comitê de auditoria olha para frente e não para fatos passados, que ficam com o conselho fiscal”, ensina André Coutinho, diretor da Management Assurance Services da KPMG, que assessora várias empresas na estruturação de comitês de auditoria. “O conselho fiscal tem representantes de minoritários; é um fórum diferente”, diz o diretor, para quem a opção das empresas tem sido claramente pelos comitês de auditoria.

Algumas, porém, resistiram à onda e optaram pelo conselho fiscal adaptado. Para a Votorantim Celulose e Papel (VCP), o fato de o conselho fiscal existir desde 2001 e já ser reconhecido e valorizado pelo mercado pesou na decisão de fazer a sua reestruturação. “Ao contrário do comitê de auditoria, ele é distinto do conselho de administração. Isso agrega valor”, afirma Guillermo Oscar Braunbeck, gerente de riscos da VCP e um dos responsáveis pela reformulação do conselho fiscal.

A maior limitação do conselho fiscal, reconhece Braunbeck, diz respeito à auditoria externa. Pela legislação societária brasileira, a contratação, destituição e remuneração das auditorias são decididas pelo conselho de administração. “Entendemos que não haverá maiores problemas, já que a SEC está consciente disso e o conselho fiscal fará recomendações e questionamentos”, explica. A VCP prepara uma profunda reestruturação no regimento interno. “Vamos au26 mentar o escopo do conselho fiscal. Existe a possibilidade de renovação integral do conselho e até de aumento do número de membros, de três para cinco.”

De fato, as decisões finais sobre a auditoria externa costumam ser tomadas pelos conselhos de administração, segundo a pesquisa da ACI/KPMG. No levantamento, apenas 11% dos comitês aparecem como responsáveis pela contratação dos auditores externos, enquanto em 68% das empresas a decisão é dos conselhos de administração. A responsabilidade também é atribuída à presidência (11%), à diretoria financeira (5%) e à auditoria interna ou de gerenciamento de riscos (5%).

As atribuições do comitê de auditoria, ou do conselho fiscal com suas funções, devem estar expressas no regimento interno, para evitar conflitos. Na VCP, a mudança de regimento está prevista para vigorar no primeiro trimestre de 2005, quando os novos nomes do conselho estarão definidos. “Temos um especialista em finanças da área acadêmica, mas parece que precisamos de alguém do mundo financeiro. O mercado está em ebulição sobre esse assunto”, diz Braunbeck.

RESPONSABILIDADES E RISCOS – “Alguns desses especialistas, com grande bagagem e patrimônio formado, tendem a não aceitar a função, por causa dos riscos de responsabilização”, explica Coutinho, da KPMG, prevendo alguma dificuldade para as empresas que não agilizarem a escolha de nomes. “Para aceitar uma posição como essa, é preciso ter certeza do apoio com que se vai contar”, confirma Tereza Grossi, ex-diretora de fiscalização do Banco Central e membro do comitê de auditoria do Itaú desde julho. “A responsabilidade se aproxima da do administrador.”

VCP escolhe ficar com o conselho fiscal: “Ao contrário do comitê de auditoria, ele é distinto do conselho de administração. Isso agrega valor.”
Apoio das demais estruturas da companhia e fluxo de informações permanente são fundamentais, afirma Tereza Grossi, membro do comitê do Itaú

O apoio a que Tereza se refere passa por encontrar abertas as portas de outras estruturas da empresa, como a auditoria interna, e contar com um fluxo de informações permanente. “Sozinho, o comitê não faz nada. Esses pontos de apoio são fundamentais para emitir uma opinião sobre controle de riscos, por exemplo”, diz ela. No Itaú, o comitê conta com a regalia de ter um membro com dedicação integral, posição ocupada pela própria economista e prevista no regimento. “Fomos além da regulamentação brasileira e seguimos o padrão da Sarbanes”, afirma Tereza.

Com a exigência do BC, os bancos constituíram os comitês de auditoria em bloco, mas reconhecem que ainda estão tomando pé de suas funções. “Depois da homologação dos membros, tivemos umas quatro ou cinco reuniões para a definição de processos”, diz Gabriel Jorge Ferreira, presidente do comitê de auditoria do Unibanco e ex-presidente da Federação Brasileira das Associações de Bancos (Febraban). O regimento, que deve ser aprovado nos próximos dias, seguirá de perto as normas estabelecidas pelo BC, prevê Ferreira. “O foco do comitê é o monitoramento de controles e a detecção de fraudes”, diz ele.

SOLUÇÕES DE GESTÃO – Para a Aracruz Celulose, uma das pioneiras em comitê de auditoria, o foco é bem mais amplo. Com o comitê instalado desde 1997, a empresa passou a contar com a sua estrutura como um apoio efetivo à administração. Isaac Sutton, diretor do grupo Safra e coordenador do comitê desde sua criação, diz que algumas pequenas adaptações serão necessárias para atender às exigências da Sarbanes, entre as quais a criação de um canal direto para denúncias. Mas ressalta que os trabalhos do grupo vêm extrapolando todas as expectativas.

“Criamos um sistema de pós-auditoria, por exemplo, que analisa a taxa de retorno de investimentos relevantes realizados três anos atrás. O resultado desse acompanhamento revelou- se importante para calibrar novos investimentos”, diz Sutton. “Já aprimoramos até a remuneração variável dos gerentes, que passou a considerar os resultados do sistema de autocontrole, que substituiu a auditoria interna na empresa” Para as companhias que pretendem embarcar na onda dos comitês de auditoria, a notícia é alvissareira: depois de algum tempo de prática, é possível aliar controle de riscos com melhorias na gestão.


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