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Emissões de cara nova
Governança, transparência e pulverização dão o novo tom das ofertas públicas de ações

ed13_p034-037_pag_3_img_001O interesse das companhias em buscar recursos no mercado de ações é apenas uma das boas notícias que surgem com a retomada das emissões. Junto com ela, uma série de novos conceitos e referências transforma o jeito de as companhias lançarem suas ações e impõe desafios inéditos para que uma oferta possa ser considerada bem sucedida.

No passado, o sucesso consistia em conseguir vender determinado lote de ações ou títulos pelo preço que fosse justo aos olhos da companhia emissora. Para isso, era preciso contar com as condições favoráveis do mercado e boas projeções de lucros futuros para a empresa. Hoje, esses dois fatores não são os únicos a dar aos coordenadores da emissão o reconhecimento da missão cumprida. Mesmo em uma situação favorável como a atual, uma oferta pública de sucesso precisa também promover a pulverização, aumentar a liquidez – o que sempre implica a participação das pessoas físicas – e contemplar a adesão a níveis diferenciados de governança corporativa.

Com esses novos paradigmas em voga, muda também o discurso que uma companhia interessada em lançar ações irá ouvir dos bancos intermediadores dessas operações (underwriters). As novidades servem tanto para aquelas que pretendem fazer uma oferta pública inicial, como para as que já têm papéis em circulação e, ao longo do tempo, irão se deparar com novas dificuldades para convencer investidores cada vez mais exigentes de que comprar suas ações é um bom negócio.

Nessa linha, garantir direitos aos minoritários é um item que parece definitivamente ter entrado em pauta. “Hoje não há mais espaço para ofertas iniciais que estejam fora dos níveis diferenciados de governança corporativa da Bolsa. Listar fora desse ambiente praticamente inviabiliza a operação, já que a empresa teria de passar a maior parte do tempo justificando a falta de garantias para os seus potenciais investidores”, diz o diretor de um dos bancos mais atuantes nesse segmento.

Além das exigências impostas pelos investidores, as empresas agora se deparam com restrições feitas pelos próprios bancos, que estão impedidos de estruturar ofertas públicas iniciais de companhias não dispostas a aderir pelo menos ao Nível 1 da Bovespa. A medida consta do código de auto-regulação da Associação Nacional de Bancos de Investimento (Anbid), lançado em 1998, e vale para todas as instituições que aderiram ao termo da associação.

A situação é menos restritiva para as empresas que já têm ações em circulação e pretendem voltar a captar no mercado. O que não significa que elas venham a passar incólumes por esse processo de seleção: “As companhias abertas que estão listadas na Bolsa vão ter de melhorar suas práticas. Se não fizerem isso, perderão espaço junto aos investidores”, diz Átila Noaldo, diretor de mercado de capitais do Banif Primus.

A preocupação com governança é maior para as emissões de ações, mas também permeia as ofertas de títulos de dívida como debêntures. Embora neste caso a análise para comprar o papel seja focada no risco de crédito e na remuneração adequada para esse nível de risco, a maior transparência e a adoção de um conjunto de práticas justas com os investidores dão mais confiança e, logo, contribuem para o êxito da operação.

ABERTURA DE INFORMAÇÕES – Nesse novo patamar qualitativo a que o mercado de capitais foi alçado, a transparência passou a pesar decisivamente. A princípio, foram os próprios investidores e organismos do mercado, como a Anbid, que, ao longo da década de 90, cobraram mais informações das companhias emissoras. “Era um outro mundo em termos de prestação de informações e transparência. Os prospectos das emissões eram bem mais simples e praticamente se resumiam às informações contidas nos IANs e ITRs”, lembra Antonio Felix de Araújo Cintra, sócio do Tozzini, Freire, Teixeira e Silva Advogados. Nada comparável às mais de 400 páginas dos prospectos de ofertas recentes como da Natura, GOL e ALL. A situação que prevalecia no início da década passada, e a que Felix se refere, começou a mudar quando as empresas brasileiras partiram para a conquista dos investidores estrangeiros por meio de American Depositary Receipts (ADRs). O aumento da transparência também foi impulsionado pelo código da Anbid, que passou a exigir o detalhamento de todos os fatores de risco. Posteriormente, as exigências do mercado foram reconhecidas pela regulamentação, por meio da Instrução 400 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

Explicar os pormenores da atuação da companhia e os riscos que o investidor correrá ao comprar uma ação ou debênture é hoje tarefa que consome grande parte do tempo dos times de advogados envolvidos nas emissões. A possibilidade de o emissor ser responsabilizado na Justiça por alguma informação – ou pela ausência dela – contida no prospecto já existia, mas a preocupação com essa questão é maior atualmente, dizem os advogados. Os bancos que participam da operação também podem ser co-responsáveis, já que eles têm o dever de realizar uma espécie de auditoria para assegurar que essas informações – que servirão como insumo para a tomada de decisão dos investidores – procedem. Por isso, está se tornando uma prática comum a contratação de dois escritórios de advocacia, um para cuidar da própria empresa, e outro para o banco. Daí surgem novas formas de conflitos de interesse durante a redação dos prospectos. Enquanto a companhia tende a diminuir os fatores de risco, o banco precisa colocá-los em patamares mais realistas.

MAIS TRABALHO – A preocupação com as informações, com governança corporativa e outros requisitos da legislação no Brasil, e até mesmo no exterior, como a lei Sarbanes-Oxley, tornaram as emissões mais onerosas. Para Alexandre Barreto, do escritório de advocacia Souza Cescon, Avedissian, Barrieu e Flesch, a regulamentação avançou bastante, mas todas as exigências que existem atualmente deixaram o acesso ao mercado mais caro e trabalhoso para as empresas. Se não fossem todas essas restrições, o número de companhias na fila das emissões provavelmente seria maior, acredita Barreto.

Mas esse aumento de custo parece ter sido neutralizado: “Os benefícios, tanto para as empresas, quanto para os investidores, compensam o fato de as emissões terem se tornado mais onerosas”, diz Fernando Yunes, diretor do Itaú BBA. Como transparência e prestação de informações reduzem o risco, as empresas conseguem vender seus papéis a preços mais atraentes. E os investidores aplicam com mais consciência.

Além de baterem na tecla da governança e da transparência, os bancos reforçam a necessidade de as companhias promoverem a liquidez dos seus papéis na Bolsa, o que requer a participação dos investidores pessoas físicas. Uma das cláusulas para entrar nos níveis diferenciados de governança corporativa da Bovespa é adotar mecanismos que favoreçam a dispersão de capital quando a companhia realizar ofertas públicas. Pelo menos 10% devem ser destinados a investidores não-institucionais ou pessoas físicas.

“O mercado descobriu que o investidor de varejo é importante porque já representa um percentual relevante na Bovespa”, diz João Carlos de Pimenta, diretor superintendente das corretoras Santander e Banespa. Em julho, a pessoa física respondeu por 30,1% do volume financeiro negociado na Bolsa, superando os investidores estrangeiros e institucionais. Ou seja, mesmo sendo ainda minoria, esses investidores estão demandando mais ações. Embora quem acabe determinando o preço seja o investidor institucional, pelo volume de recursos que emprega, o pequeno aplicador confere maior liquidez e estabilidade ao papel.

Enquanto as companhias tendem a diminuir os fatores de risco, o intermediador se preocupa em trazê-los para patamares mais realistas

OFERTAS PULVERIZADAS – Para atrair esses novatos, a estratégia também está mudando. Além de buscarem distribuir suas ações por meio de bancos de varejo, muitas empresas estão realizando ofertas pulverizadas com a parceria de corretoras. Essas entram em contato com seus clientes para divulgar a operação e são remuneradas de acordo com o número de pessoas físicas (ou CPFs) que conseguirem atrair.

Na oferta da Natura, que seguiu esses moldes, a demanda foi de cerca de cinco mil pessoas físicas. Na GOL, foram 12 mil investidores individuais. O próprio sucesso da oferta da Natura atraiu novos aplicadores para a emissão da Gol. “Muitos investidores que entraram nas recentes ofertas estavam apenas interessados em vender o papel rapidamente para realizar o lucro”, diz um profissional.

No processo de aprendizado que terão sobre a renda variável, ainda apenas no começo, o importante é que o investidor perca o medo, não tenha surpresas pela frente (daí, mais uma vez, a importância da transparência) e passe a ter uma imagem positiva do mercado de capitais, diz Denise Pavarina, diretora do Bradesco. Ela acredita que esse momento é promissor e pode dar frutos, pois as companhias e o mercado têm boas perspectivas, abertas pelo crescimento econômico.

O aprendizado dos investidores sobre o funcionamento das aplicações em bolsa de valores tem melhorado com todas as campanhas levadas a cabo por parte da Bovespa, dizem os profissionais. Mas, talvez, o conhecimento deste mercado tenha sido o item que evoluiu mais vagarosamente desde a década passada, pois está bastante relacionado aos traumas financeiros que persistem na memória de quem os sofreu na pele.

Para que o mercado tenha sucesso, é necessário que seja desenvolvida uma nova cultura por parte dos empresários e também dos aplicadores, diz José Eduardo Carneiro Queiroz, do escritório de advocacia Mattos Filho, Veiga Filho, Marrey Jr e Quiroga. O próprio aumento da participação da pessoa física nesse mercado poderá levar a vários questionamentos judiciais no futuro se não houver um entendimento razoável do investimento em ações por parte dos novatos. Portanto, todo cuidado é pouco quando os ventos começam a soprar a favor do mercado de ações. Está aí a oportunidade de se criar uma memória feita de boas histórias para os novos investidores.


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