Seja por erros internos ou pelo ambiente macroeconômico deteriorado, muitas companhias hoje atravessam uma crise. A situação constitui o verdadeiro teste de fogo para o sistema de governança e, particularmente, para os conselhos.
Nessas ocasiões, o conselho tem a oportunidade de demonstrar seu valor inestimável para a organização se conseguir evitar o pânico, manter o apoio dos stakeholders e exercer a liderança nas decisões difíceis. Há quatro passos principais que o órgão deve seguir:
1. Aceitar a realidade;
2. agir rapidamente para conter a crise;
3. modificar o papel do conselho durante a crise para adaptação à nova realidade;
4. comunicar de forma clara ações e soluções.
O primeiro passo é aceitar a nova (e dura) situação. Como “percepção é realidade”, o conselho deve ter ciência de que a companhia será muito afetada caso seus públicos de interesse acreditem, mesmo que só com base em rumores, que ela está em crise. Uma vez quebrada a confiança dos stakeholders, a empresa correrá o risco de entrar em uma espiral descendente na qual poderá perder cada vez mais recursos, profissionais, clientes e parceiros. Nessa etapa, um dos principais desafios é evitar gastar um tempo precioso procurando defender decisões anteriores ou culpando fatores externos. O conselho deve se concentrar em responder a duas questões: o que precisa ser feito imediatamente para a companhia sobreviver e o que é necessário fazer para a que companhia saia fortalecida da crise.
A aceitação leva ao segundo passo. Nele, a rapidez é essencial — e os conselheiros devem estar preparados para se dedicar muito mais do que o habitual. Entre as medidas que o órgão deve tomar destacam-se: evitar desperdício de recursos, a fim de “estancar o sangramento” imediatamente; identificar as causas que levaram à crise; evitar que a empresa fique paralisada; decidir sobre a substituição (ou não) de executivos; avaliar a necessidade de se criar um comitê dedicado à resolução da crise; procurar elevar o caixa para assegurar a solvência; comunicar o plano de resolução aos stakeholders.
No terceiro passo, a resposta específica depende principalmente da percepção de a diretoria ter ou não capacidade para lidar com a crise. Quanto menos o conselho perceber que os diretores são capazes de resolver os problemas, mais deverá “arregaçar as mangas”, atuando diretamente junto aos stakeholders e tomando decisões emergenciais (envolvendo até a substituição da própria gestão). Por outro lado, se o órgão avaliar que a gestão é competente, pode se dar ao luxo de se concentrar nas questões pós-crise, como o uso das lições aprendidas para promover mudanças estruturais na organização.
Os papéis do presidente do conselho e dos conselheiros independentes podem se alterar no período crítico. Além de manter as atribuições tradicionais, o presidente pode atuar nas negociações com stakeholders, liderar o comitê para resolução de crises, procurar sucessores para a diretoria e redesenhar os limites de atuação entre gestão, conselho e acionistas. Os conselheiros independentes também têm um papel-chave na crise. Cabe a eles, por exemplo, fazer perguntas ainda mais difíceis (mesmo que dolorosas ou incômodas) e até ajudar os executivos no comando dos negócios.
O último passo envolve a comunicação com os stakeholders. É nesse momento que o estabelecimento de um bom relacionamento prévio com eles faz diferença — como diz o adágio, “é muito improvável se conseguir fazer novos amigos no meio de uma crise”. É necessário um equilíbrio entre a admissão da gravidade da situação e a demonstração da confiança de que a empresa tem capacidade para se restabelecer. Outro elemento importante: não ocultar fatos relevantes ou criar expectativas irrealistas. Além de poder vir a ser objeto de processos, a empresa pode perder ainda mais apoio de seus públicos de interesse se agir assim.
É numa crise que os conselhos, muitas vezes criticados por sua passividade, têm uma oportunidade de ouro para demonstrar que podem agregar valor às organizações. Além de conseguir fazer a empresa atravessar o período turbulento, o conselho pode fazer com que ela aprenda lições fundamentais, de forma a emergir ainda mais forte.
*Alexandre Di Miceli da Silveira é sócio-fundador da Direzione Consultoria e autor de Governança corporativa: o essencial para líderes. O articulista agradece a Angela Donaggio pelos comentários e sugestões.
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