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Alinhamento internacional
Tendências apontam para a convergência com o resto do mundo, principalmente em questões ligadas à contabilidade e à governança corporativa

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Logo depois da promulgação da Lei das S.As, representantes de países europeus vieram ao Brasil para estudar o feito de Lamy e Bulhões. Ainda não se previa a atual globalização do mercado, nem a sofisticação de operações que derivaria desse movimento, mas uma convergência entre as leis já se insinuava como tendência. O resultado desse intercâmbio, na época, foi a alteração de várias leis em países europeus, que hoje caminham para uma uniformização entre si, promovida pela Comunidade Econômica Européia.

O Brasil já se rendeu è evidência de que as práticas contábeis serão mesmo globalizadas. Uma reforma nesse sentido, inclusive, tramita — a passos lentos — no Congresso Nacional. Já em outros aspectos, como nas regras de governança corporativa, a tendência de convergência é um tanto mais polêmica. Há diferenças significativas de culturas, realidades de mercado e tradição legislativa. Mas, afinal, até onde irá a globalização na lei das sociedades anônimas?

Na parte contábil, a experiência mostra que o país precisa com urgência incorporar institutos e práticas globais que ainda não foram regulados por aqui, diz Alexandre Oliveira, diretor da PricewaterhouseCoopers. Os chamados instrumentos híbridos (títulos que reúnem dívida e capital), por exemplo, no Brasil não podem ser considerados como capital, ao contrário de outros países e da lógica contábil no mundo, conta ele. Na prática, as divergências dificultam o entendimento dos investidores estrangeiros e tornam as empresas brasileiras menos competitivas.

A convergência nas práticas contábeis melhora a transparência e possibilita maior comparação entre os resultados de empresas de países distintos. O problema é que o processo de mudança legislativa é complexo no Brasil, como percebem, aflitas, as empresas de auditoria que acompanham o projeto que reforma a parte contábil da lei (PL 3.741), em tramitação no Congresso desde 2000. A cultura do nosso Direito é de detalhar as leis, lembra a advogada Elidie Bifano, especialista da PricewaterhouseCoopers na área tributária. Essa característica, quando aplicada a convenções e contas, tende a criar engessamentos. “O mundo tecnológico e operacional muda rapidamente”, lembra ela.

No caso da reforma contábil em curso, as resistências aos custos de operacionalização da nova estrutura contábil, mais moderna e sofisticada, ajudaram a atrasar o processo. “Além disso, nem todas as empresas gostariam de ter seus ativos intangíveis registrados e evidenciados para efeito fiscal”, observa Oliveira, ressaltando outra prática de contabilização considerada irreversível. Para José Roberto Carneiro, sócio da área de auditoria da Deloitte, o mundo está passando por um intenso processo de sofisticação das práticas comerciais. “Temos uma demanda de operações com derivativos, reestruturações societárias, operações mais complexas”. Ao mesmo tempo, as novas práticas seguem, desde o nascimento, o caminho da uniformização. “O mercado financeiro se globalizou definitivamente.”

GOVERNANÇA NA LEI? — Se nas demonstrações financeiras a necessidade de se adotar a linguagem internacional é evidente, nos recentes IPOs, destinados principalmente aos investidores estrangeiros, ficou claro que as regras de governança corporativa caminham no mesmo sentido, observa Carneiro. No entanto, há dúvidas sobre se, no caso da governança, existe a mesma premência de levar para a lei o novo patamar de exigência do mercado. O sucesso da auto-regulação, que tem levado um número expressivo de empresas a optar pelo Novo Mercado da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), com exigências maiores em relação à transparência e à governança, leva a crer que isso pode simplesmente não ser necessário.

“Haverá uma tentativa de se consolidar os conceitos da governança corporativa em artigos da lei”, prevê o advogado José Alexandre Tavares Guerreiro. “Isso vai acontecer quando a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) tiver que solucionar um problema concreto e for constatado que a prática do mercado é diferente da lei. Aí a segurança jurídica começará a ficar ameaçada.” Já para Luiz Leonardo Cantidiano, ex-presidente da CVM, não se deveria tentar levar para a lei as regras ditadas hoje pelo Novo Mercado. “A autoregulação por si só cria um circulo virtuoso.”

Elidie, da Price, lembra que, em última instância, o futuro da governança na lei depende da sociedade brasileira. “Em filosofia, se diz que a lei só colhe aqueles valores que são importantes para a sociedade. Se o Estado perceber que a governança é um valor, ela poderá ser objeto de regulação ou até de lei no Congresso Nacional”, afirma, acrescentando que no Brasil essas regulações tendem a acontecer via lei ordinária.

Uma espiadela sobre o que está acontecendo no mundo pode ajudar a prever os rumos da governança na lei societária brasileira. A advogada Norma Parente observa um padrão nesse dilema entre a regulação e a auto-regulação: “Em países onde a punição é muito severa quando regras não são cumpridas, a auto-regulação é espetacular. Mas onde a sensibilidade à lei não é tão grande, há uma necessidade de se regular mais”, diz ela.

TROPICALIZAÇÃO CRÍTICA — Para o advogado Nelson Eizirik, a legislação societária brasileira deverá seguir o caminho das demais. “A convergência entre as leis do mundo já está ocorrendo”, observa. “Isso começou quando boa parte das jurisdições européias seguiu o modelo societário americano, criando agências de regulação inspiradas na SEC.” O Direito comunitário europeu na área societária é feito através de diretivas, que recomendam aos países que adotem certos padrões. Luiz Antônio Sampaio Campos lembra que várias questões estão sendo unificadas pela Comunidade Econômica Européia. “Temos que tropicalizar esses caminhos, com visão crítica. Mas os sistemas jurídicos romano-germânicos estão em convergência. E não é só em S.As.”

Se o processo de convergência é inevitável, Oliveira, da Price, lembra que estamos à frente desse movimento. “Estamos muito adiante de China, Rússia e Índia, por exemplo”, diz o diretor, comparando a nossa legislação com as dos gigantes emergentes saídos de regimes comunistas. “Nosso direito societário foi pensado e estruturado. Isso é um diferencial importante, nos dá uma agilidade de mercado que eles não têm.” Mas para manter a dianteira, vale lembrar, é preciso repetir os acertos do passado, além de emplacar novos.


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