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Senhor Barriga: a arbitragem contra-ataca
Se o Seu Madruga tivesse que depositar o aluguel atrasado em juízo, ele entraria em um acordo antes que o Professor Girafales chegasse para tomar uma xícara de café
Senhor barriga, Senhor Barriga: a arbitragem contra-ataca, Capital Aberto

Assim como o Senhor Barriga sempre cobrava o aluguel de Seu Madruga – ainda que de maneira ineficiente, o mercado de CRIs também não deve dar espaço para inadimplências, especialmente quando se trata de contratos atípicos. No artigo anterior tratando do tema (leia aqui) , discutimos como a moda de questionar esses contratos poderia ser perigosa e prejudicial para o mercado. Agora, com uma recente decisão arbitral exigindo o depósito de um aluguel em juízo, parece que o cenário volta a “normalizar” — e talvez, diferentemente do Seu Madruga que sempre encontrava uma forma de se safar, os devedores de aluguel do mercado de capitais terão que repensar suas estratégias jurídicas e midiáticas antes que a situação se complique ainda mais – não pagar um aluguel devido pode impactar outras captações futuras daquela empresa, afinal ninguém gosta de emprestar dinheiro a um suposto devedor contumaz.

Senhor barriga, Senhor Barriga: a arbitragem contra-ataca, Capital Aberto

A arbitragem e o mercado de capitais

A arbitragem é um mecanismo de resolução de conflitos cada vez mais utilizado no mercado de capitais, especialmente quando se trata de contratos complexos, como aqueles que ficaram conhecidos como atípicos. Diferente de um processo judicial regular, a arbitragem oferece um caminho mais rápido, especializado e confidencial para solucionar disputas. No ambiente volátil do mercado de capitais, onde o tempo é essencial – especialmente para os CRIs e FIIs, a arbitragem se apresenta como uma alternativa que protege as partes envolvidas, evitando a exposição prolongada e pública que um litígio judicial traria.

Para os credores e investidores, a arbitragem traz a vantagem de uma resolução célere e, muitas vezes, mais justa, por ser conduzida por especialistas na matéria em questão. Além disso, o caráter sigiloso das arbitragens permite que o mercado não seja abalado por especulações ou incertezas que poderiam surgir durante um processo judicial tradicional. Contudo, essa celeridade e eficiência não devem ser confundidas com leniência; decisões arbitrais são tão vinculantes quanto uma sentença judicial, e o não cumprimento pode resultar em sérias consequências para a parte perdedora.

É nesse contexto que uma recente decisão de obrigar o depósito do aluguel em juízo deve ser compreendida. Essa medida é uma resposta contundente a tentativas de se esquivar de responsabilidades contratuais – força o devedor a já se preparar para “perder” a arbitragem – e quando perder não haver negociação para o pagamento dos valores em disputa. Me parece na verdade que esse movimento é uma orientação de caminho para o devedor buscar um acordo favorecendo os credores.

Possível realidade alternativa

Imagine que uma empresa de renome no mercado de capitais resolva captar recursos no mundo alternativo do Chaves. E essa captação fosse baseada no seu contrato de locação de sua sede corporativa. Agora imagine que no contrato de locação tivesse uma cláusula que dissesse: “eu autorizo a empresa que está fazendo minha sede a usar o meu nome no mercado de capitais, de maneira expressa”. Esta autorização é o equivalente a dizer: “use meu nome para captar os recursos, eu autorizo”. Imagine um credor – profissional ou não – olhando para uma possível dívida com aquele nome “triple A”.

O racional de aprovação de crédito seria totalmente focado naquele nome. Agora imagine que houvesse uma “avaliação de uma agência de rating” indicando que aquele racional estava correto, dando uma nota “triple A” para aquele ativo – e dando o nome do CRI como se fosse daquela empresa. Embora tivessem riscos “acessórios” é natural que os investidores naquele mundo alternativo “tivessem seus vieses de análise indicados para um norte”.

Agora imagine que esta realidade alternativa fosse no início de um mercado. Com poucos investidores institucionais naquele momento e muitos investidores pessoa física. Algo como 10, 12 anos atrás de um mercado mais maduro e com mais informação.

Esta realidade alternativa pode ter acontecido em algum universo neste multi-verso do “Chavo del ocho”. Muitos “Senhor Barriga” teriam tomado gato por lebre, enchendo a vila de “Seu Madruga” ao invés de colocar uma “Dona Florinda” ou “Dona Clotilde” para equilibrar seus riscos.

Senhor barriga, Senhor Barriga: a arbitragem contra-ataca, Capital Aberto

Eu tenho a barriga Senhor Dinheiro!

Um possível devedor que use a mídia para se colocar como vítima igual aos credores que financiaram sua sede corporativa está igual ao Chaves trocando o nome do Senhor Barriga por algum objeto que ele esteja segurando ou querendo. Ainda mais que tenha supostamente colocado no seu contrato atípico que os credores poderiam usar o seu nome expressamente para captar os recursos para construir aquela sede. “Ahn mas eu não estava aqui quando foi assinado o contrato”. Pois veja bem essa é a beleza dos contratos. Deixam “vestígios” e mostram o “espírito” com o qual foram assinados.

Só a demonstração pública de uma busca de um acordo num curto espaço de tempo já mostraria “culpa no cartório”. 

O discurso de “sob nova gerência” não anula os factuais do modo / conceito que a dívida supostamente tenha sido estruturada – como basicamente o “apelido do CRI” ser o nome da empresa.

Análise anacrônica de um CRI ou um contrato BTS

Vi e ouvi diversas pessoas sobre um suposto caso no mercado, neste multiverso de “Senhor Barriga” e “Seu Madruga”. E recorrentemente ouvi análises do tipo “ahn mas este CRI deveria contar com Alienação Fiduciária (AF)” ou ainda “este CRI foi mal estruturado, é uma agulha no palheiro” e para completar “quem comprou não analisou direito”. Engenheiro de obra pronta é o que tenho mais visto neste possível caso. Mas devemos lembrar-nos que há 12 anos atrás o mercado era outro, a capacidade técnica e mais ainda: os problemas que tinham acontecido eram bem menos do que hoje.

Ao analisarmos um CRI que foi emitido há mais de 10 anos atrás com as ferramentas e experiência que temos hoje é algo que deveria ser considerado impossível. Pois foi justamente estes supostos CRI que pavimentaram onde chegamos hoje. E mais: na época este suposto CRI tinha o lastro uma das maiores companhias de um suposto país chamado Brasil, e que também na época era uma suposta estatal. Imagina uma estatal dar em garantia sua sede – um prédio do governo? Um suposto CRI “triple A” com AF de um prédio de estatal? Nem caberia numa realidade alternativa – até porque provavelmente a suposta estatal não aceitaria dar a alienação fiduciária naquela época. O mercado está amadurecendo. E precisamos pegar estes supostos casos como um aprendizado e fortalecer os contratos atuais de possíveis falhas que aconteceram recentemente – e não encarar como um erro de análise ou estruturação na época em que foram feitos. Muitos de nós ainda nem trabalhava com securitização ou mercado imobiliário naquele momento – e os que trabalhavam estavam pavimentando o caminho que nos permitiu chegar aqui. Com muita estrada já feita – e uma estrada de alta velocidade.


Felipe Ribeiro é Sócio Diretor de Investimentos Alternativos do Clube FII, atua apoiando a regulação e autorregularão de securitização do mercado desde 2012, e é autor do primeiro livro dedicado a FIIs de CRI no Brasil



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