O crédito para empresas acelerou nos últimos meses, especialmente nas operações de mercados de capitais. Mesmo as alterações recentes nos Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI), Certificados de Recebíveis Agrícolas (CRA) e nas debêntures ligadas a projetos de infraestrutura não reduziram significativamente as emissões de dívidas. Os bons resultados da economia, boa parte impulsionados pelo aumento da renda das famílias (vindo do trabalho e das transferências do governo), estão mantendo as atividades das empresas aquecidas.
Com grande surpresa, o Conselho Monetário Nacional (CMN), órgão máximo do sistema financeiro brasileiro, resolveu no dia 1° de fevereiro restringir substancialmente a emissão de CRIs e CRAs. A leitura da resolução 5.118 indica os alvos específicos do governo. Empresas abertas ou suas partes relacionadas não podem emitir os títulos que darão origem aos CRIs e CRAs, a não ser que seu principal setor de atuação seja o imobiliário ou o agronegócio. Isso também vale para instituições financeiras. Duas outras restrições terão repercussões muito amplas: vedação de operações entre partes relacionadas e de reembolso de despesas como origem para essas dívidas, esta última um exagero. O assunto foi muito bem analisado pelo Felipe Ribeiro nos artigos aqui na Capital Aberto.
As mudanças em infraestrutura vieram no decreto 11.964. As principais alterações foram a exclusão dos setores de petróleo e do cultivo de cana-de-açúcar e outros produtos usados para produção de biocombustíveis da lista de elegibilidade de setores prioritários. Ao contrário do noticiado pela imprensa até a véspera da sua divulgação, o decreto não impede o uso da outorga para o limite a ser emitido pelos instrumentos. Seguindo uma lei há muito aprovado, finalmente o decreto permite a emissão de debêntures incentivadas por projetos de geração distribuída.
Os dados de abril ainda não estão disponíveis, mas em março já era possível ver que o impacto não foi relevante. Os dados do Banco Central, incluindo o mercado de capitais, mostram que o crédito para empresas chegou a 51,5% do Produto Interno Bruto (PIB), o maior desde janeiro de 2023. Nos últimos meses, o crescimento está acelerando e chegou a 7,4% em relação ao mesmo mês de 2023. Os empréstimos bancários crescem 4,2% enquanto a emissão de títulos avança 19,3% e os instrumentos de securitização sobem 33,8%. A inadimplência dos empréstimos está baixa e estável em 2,5%. A taxa das debêntures corporativas caiu para os níveis pré-Americanas nos últimos meses, em particular as de rating mais elevado que já estão pagando menos do que em janeiro de 2023.
As empresas estão se beneficiando da boa conjuntura macroeconômica, com renda das famílias crescendo 7,1% em termos reais nos 12 meses até fevereiro deste ano, fruto do aumento de 6,3% da renda do trabalho e de 8,5% das transferências do governo. A conjuntura doméstica ajuda a manter a inflação acima da meta e em conjunto com o cenário externo fez o BC ser mais conservador com os próximos passos da política monetária – a Selic deve continuar próxima a 10% por algum tempo.
Ainda não é possível dimensionar o primeiro trimestre das empresas abertas, por isso olhando as informações do quarto trimestre de 2023, a alavancagem ficou estável, com queda da relação dívida líquida por Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) em consumo e utilities. A margem ebitda está estável, um pouco abaixo de 20%, em média, e caindo no setor de commodities, mas ainda em patamar bem próximo a 35%. Em relação às expectativas, 41% das empresas tiveram receitas acima do esperado pelo consenso, enquanto 50% ficaram abaixo. Os setores que tiveram melhor desempenho nessa métrica foram: alimentos, saneamento e elétricas. Já imobiliário e shopping e papel e celulose tiveram o maior número de empresas com receitas abaixo do esperado. No agregado de 160 empresas, sem considerar Petrobras e Vale, a receita agregada caiu 1,5% em relação ao quarto trimestre de 2022. Já o lucro líquido cresceu 8,8%. A previsão de desaceleração econômica que era consensual no ano passado ainda não se concretizou. O mercado de trabalho continua forte e as transferências do governo são crescentes. O BC deve manter a taxa de juros perto de 10% por mais tempo que o mercado precificava. Mesmo com as alterações no mercado de crédito, as emissões no mercado de capitais continuam fortes e os preços que as empresas pagam nessas operações caíram consideravelmente nos últimos meses
Evandro Buccini é sócio e diretor de gestão de crédito e multimercado da Rio Bravo
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