Em decisão do último 22 de abril, o colegiado da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) indeferiu, por maioria de votos¹, um pedido de adiamento do prazo de convocação da assembleia geral ordinária e extraordinária (AGOE) de companhia aberta, a despeito de falha informacional em sua convocação.
Conforme consta da decisão, em 23 de março de 2019, a companhia aberta arquivou perante a CVM o edital de convocação de sua AGOE, a ser realizada em 24 de abril. Naquele mesmo dia, divulgou também a proposta da administração e o boletim de voto à distância, sem informar os nomes dos candidatos indicados pelo controlador para os cargos de membros do conselho de administração.
Em 12 de abril, a companhia aberta retificou a proposta da administração para incluir os nomes dos indicados ao conselho. O boletim de voto à distância não foi reapresentado, uma vez que o prazo legal para sua retificação já havia expirado.
Em 16 de abril, um acionista da companhia aberta protocolou pedido de interrupção da convocação da AGOE, alegando, dentre outros motivos, a falta de indicação dos candidatos do controlador no boletim; a ausência de informações sobre a indicação de candidata indicada por sócios minoritários; e a suposta estratégia do controlador para “induzir o acionista ao erro” e causar um “fechamento branco do capital”.
A companhia aberta se manifestou afirmando que publicou a proposta e o boletim sem os nomes dos candidatos pois não havia recebido a tempo as indicações do acionista controlador com as formalidades requeridas pela Lei das Estatais. Quando tais indicações foram recebidas, a companhia atualizou a proposta da administração, mas não pôde fazer o mesmo com o boletim, devido à expiração do prazo legal. A companhia rejeitou também qualquer tentativa de “fechamento branco do capital” na proposta de reforma do estatuto, mas afirmou que cancelou a ordem do dia da AGE que trataria do tema para aprofundar as discussões.
Em sua análise do pedido de interrupção, a área técnica da CVM afirmou primeiramente que, por se tratar de assembleia geral ordinária, não era possível a aplicação do disposto no artigo 124, §5º, II, da Lei das S.As. diante da literalidade da norma. Tal inciso autoriza a autarquia a interromper o curso do prazo de convocação apenas de uma assembleia geral extraordinária, “a fim de conhecer e analisar as propostas a serem submetidas à assembleia”.
A questão girou então em torno da possível aplicação do inciso I do mesmo artigo, que permite a CVM a aumentar para até 30 dias o prazo de antecedência de convocação, contados da disponibilização dos documentos, “quando [a assembleia] tiver por objeto operações que, por sua complexidade, exijam maior prazo para que possam ser conhecidas e analisadas pelos acionistas” — sem grifo no original.
Segundo a área técnica, embora a divulgação dos nomes dos candidatos tenha ocorrido após o prazo máximo para retificação do boletim de voto a distância, tal informação foi objeto de retificação da proposta da administração com 12 dias de antecedência da AGO, o que considerou um prazo razoável para a questão. Diante disso, a área técnica não vislumbrou complexidade de tema que justificasse o aumento do prazo de convocação da assembleia.
Além disso, a área técnica entendeu também que, caso a CVM autorizasse o aumento do prazo, a AGO seria realizada fora do prazo estipulado pela Lei das S.As. (de acordo com o seu artigo 132, a AGO deve ocorrer nos quatro primeiros meses após o término do exercício social). O colegiado, por unanimidade, discordou da área técnica nesse ponto, pois “o descumprimento incidental do art. 132 não deveria ser impeditivo da determinação da CVM nesse sentido.”
Já com relação à ausência de complexidade no caso, o colegiado da CVM, por maioria, concordou com a opinião da área técnica. Segundo a maioria, “a complexidade referida no dispositivo deve ser inerente à matéria objeto da deliberação e não decorrente de circunstâncias que, embora possam interferir no exercício do direito de voto pelos acionistas, demandariam tempo para correção de falha informacional, mas não para melhor compreensão da matéria em si dada sua complexidade.”
Em outras palavras, uma mera insuficiência de informações para subsidiar o exercício do voto pelos acionistas não é capaz de trazer, por si só, complexidade que possa justificar o adiamento da assembleia pela CVM. Diante disso, o colegiado da CVM indeferiu o pedido de aumento do prazo de convocação da AGO.
Embora tenha indeferido o adiamento da assembleia, o colegiado reconheceu que houve de fato um descumprimento da Instrução CVM 481/09, notadamente dos arts. 10 e 21-A, §1º, por conta do atraso na divulgação das informações. Espera-se que essa falha seja apurada pela CVM em procedimento apartado.
Além disso, o colegiado pontuou que a Lei das S.As. é “anterior à previsão do mecanismo de voto à distância e à dinâmica dele decorrente de modo que, eventualmente, será necessária uma atualização do diploma legal para que sejam concebidas as devidas proteções aos acionistas em casos como o presente.”
* Por Fernando dos Santos Zorzo ([email protected]), sócio de Pinheiro Neto Advogados, Cauê Rezende Myanaki ([email protected]), associado sênior e Victor Dalla Déa Barone ([email protected]), associado do escritório.
1 Processo CVM SEI 19957.004691/2019-68
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