No Brasil, mudanças regulatórias têm tido impacto direto sobre a realidade das instituições financeiras. Um exemplo é a recente publicação da Resolução 4.557 do CMN (Conselho Monetário Nacional), que estabelece parâmetros mínimos para a montagem das estruturas de gerenciamento de riscos e de capital nesse setor. A resolução é conhecida como GIR (gestão integrada de riscos).
Muitas organizações, no mundo todo, continuam aperfeiçoando suas práticas de gerenciamento de riscos e a 10ª edição da pesquisa global de Gestão de Riscos, elaborada neste ano pela Deloitte, revelou que os líderes de instituições financeiras estão de fato focados no impacto regulatório decorrente de recentes mudanças geopolíticas e questionam o que, num futuro próximo, pode afetar os negócios. Participaram77 organizações, principalmente bancos e seguradoras.
Vários aspectos retratados pelos participantes merecem atenção e ensejam uma reflexão a respeito da maturidade das práticas adotadas no Brasil. Por exemplo: a posição de CRO (chief risk officer, líder da área de riscos nas instituições) tornou-se quase universal, e a tendência é de que esses executivos se reportem cada vez mais direta e especificamente ao conselho de administração e ao CEO (chief executive officer, ou presidente).
Pode-se observar que as maiores instituições financeiras brasileiras, assim como as que têm matrizes no exterior, aderem a essa tendência. Já nas demais instituições, que têm estruturas organizacionais mais enxutas, a responsabilidade pela gestão de riscos é compartilhada entre executivos que exercem outras atribuições, principalmente administrativas. Importante notar que a Resolução 4.557 determina, de maneira expressa, a designação de um CRO.
Em relação à segurança digital, menos da metade dos participantes da pesquisa (42%) considera sua instituição de fato efetiva na gestão desse risco. Além disso, ameaças à segurança estão entre as três principais preocupações dos executivos na gestão de riscos. Comparando-se com outros países, o Brasil ainda tem uma regulamentação tímida em relação aos requisitos a serem observados na gestão do risco digital (o chamado cyber risk). A nova resolução aborda também esse tema, mas ainda de maneira sucinta.
Outro destaque da pesquisa é o uso cada vez mais efetivo dos testes de estresse. Em muitos países, os órgãos reguladores vêm reforçando os requisitos regulatórios para seu uso na avaliação da adequação do capital regulatório e da liquidez. Dos participantes, 83% confirmam sua utilização. Por outro lado, somente agora, por meio da Resolução 4.557, essa prática passa a ser exigida no Brasil com critérios específicos e rigorosos, mais alinhados às práticas internacionais.
Dentro do tema risco estratégico, um aspecto que vem sendo abordado pelas instituições está relacionado às startups que fornecem soluções disruptivas em finanças, as fintechs. Com uso intensivo de tecnologia, além de muita agilidade, essas empresas já começaram a competir com bancos, gestoras de investimentos e seguradoras, ofertando novos produtos e soluções, sem as obrigações que a atual regulamentação determina.
Apesar da participação ainda muito tímida no mercado, as fintechs vêm crescendo rapidamente. Enquanto os reguladores ao redor do mundo têm estudado novas formas de disciplinar a atuação dessas empresas, as instituições tradicionais buscam parcerias com as fintechs que têm maior potencial. São desafios na gestão do risco estratégico a manutenção da rentabilidade atual e a sobrevivência a possíveis cenários de disrupção decorrentes dos novos competidores.
A pesquisa apresenta ainda diversas informações sobre outros tópicos relevantes nas práticas de gestão de riscos, incluindo o custo de compliance (valores para manutenção de estruturas de cumprimento de conformidade nas instituições, que são cada vez mais relevantes), a disputa no mercado por profissionais especializados, a adoção de programas de gestão integrada de riscos e o envolvimento da alta administração na estratégia e na supervisão das linhas de defesa.
Apesar de reconhecido como robusto e equilibrado, o sistema financeiro brasileiro precisa se alinhar aos desafios impostos tanto pelas mudanças regulatórias quanto pelas velozes e radicais alterações no ambiente de negócios. O certo é que, para encarar com segurança esses novos desafios, as instituições financeiras locais precisam de investimentos significativos em processos, tecnologia e, sobretudo, em atualização e capacitação de seus profissionais.
Confira o estudo aqui.
*Por Marcello De Francesco, sócio da área de Risk Advisory da Deloitte Brasil.
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