Os acordos de acionistas ou sócios desempenham um papel crucial na governança das empresas, proporcionando uma estrutura para a gestão de conflitos e definição de direitos e deveres entre os acionistas. Embora frequentemente vistos como meras formalidades, esses documentos podem conter cláusulas que, à primeira vista, parecem inofensivas, mas têm o potencial de gerar sérios problemas no futuro.
É comum encontrar em atas de reuniões ou assembleias a frase final: “Confere com o original lavrado em livro próprio”, que nada mais é do que um procedimento que determina a obrigatoriedade de registrar as atas em livros societários. Contudo, é comum que a ata registrada seja assinada apenas pelos membros da mesa, como o presidente e o secretário, enquanto a versão registrada no livro societário inclui a assinatura de todos os acionistas presentes.
Agora, imagine um cenário em que os acionistas não estão alinhados com a gestão dos negócios sociais e o acordo não define previamente quem será designado como presidente e secretário da mesa. Nessas situações, há o risco de que atos sejam registrados sem o conhecimento prévio de todos os acionistas e, até que tal fato seja identificado, podem surgir efeitos legais e decisões que afetam a empresa.
Estabelecer mecanismos eficazes para a escolha da mesa nas assembleias e reuniões não apenas ajuda a prevenir ações por parte de acionistas que possam estar em desacordo com os interesses da companhia, mas também facilita a comprovação de eventuais lesões aos direitos dos acionistas em disputas judiciais.
Uma das cláusulas mais comuns em acordos de acionistas define as regras para a transferência de participação societária, estabelecendo critérios e procedimentos a serem seguidos em caso de transferência de ações, como por exemplo drag e tag along (cláusula de proteção ao acionista majoritário) e direito de preferência. Exceções às regras de transferência de ações (Transferências Permitidas) como transferências de um acionista para uma sociedade controlada por ele, embora pareçam simples, facilitam aspectos burocráticos.
É crucial que a cláusula de transferência exija que o acionista cedente mantenha o controle e/ou a totalidade da participação na sociedade após a transferência das ações, salvo com a anuência prévia de todos os demais acionistas. Dessa forma, evita-se a entrada indireta de pessoas alheias aos interesses sociais e, consequentemente, possíveis disputas entre acionistas.
O Código Civil estabelece a possibilidade de exclusão judicial de sócios por falta grave no cumprimento de suas obrigações ou por incapacidade superveniente, conforme o Artigo 1.030. Também admite a exclusão extrajudicial se o sócio for remisso (art. 1.058) ou colocar em risco a continuidade da empresa (Art. 1.085), desde que a possibilidade esteja prevista no contrato social como motivo de exclusão por justa causa.
Fato é que, por vezes, há discussões sobre quais seriam as possibilidades de classificar um sócio como faltoso, a fim de comprovar judicialmente a sua falta perante a sociedade. Além disso, há debates sobre como demonstrar extrajudicialmente que o sócio está colocando em risco a continuidade da empresa.
Estabelecer critérios claros para definir o que constitui uma falta grave por parte de um sócio, mesmo que essa definição não seja absoluta e taxativa, facilitará a compreensão entre todas as partes envolvidas e garantirá que, caso uma falta seja identificada, todos estejam cientes das implicações. Isso reduz o risco de disputas judiciais e proporciona um entendimento comum e preventivo sobre as consequências e responsabilidades associadas a tais situações.
Portanto, embora algumas cláusulas possam parecer simples, é importante observar a realidade da empresa e definir regras claras e eficazes para a gestão das assembleias, garantir a manutenção do controle após transferências permitidas de ações e definir criteriosamente o que configura uma falta grave por parte de sócios com o intuito de proteger a integridade da empresa e assegurar um ambiente corporativo harmonioso. Ao abordar esses aspectos com precisão e antecipação, as empresas podem minimizar riscos e promover uma gestão mais eficaz e equitativa, resultando em um ambiente mais estável e produtivo para todos os acionistas.
Rafael Teixeira e Lethycia Florencio são, respectivamente, sócio e advogada da prática de Societário do BVA – Barreto Veiga Advogados
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