No fim do ano 2000, quando a B3 criou o Novo Mercado, as discussões sobre o fortalecimento da governança das empresas ainda não haviam passado pelos grandes escândalos contábeis que levaram à falência ícones como Enron, Arthur Andersen e World Com. Mas a demanda por regras que pudessem proteger os investidores de forma mais efetiva fazia parte do debate no mercado brasileiro — que, passados 20 anos da estreia do segmento com as mais altas exigências de governança da bolsa, opera em uma realidade bastante diferente.
À época havia debates bastante intensos em torno da utilização de estruturas com ações preferenciais, num cenário em que prevalecia a desconfiança do investidor em relação ao respeito a seus direitos como acionista minoritário.
Uma ação, um voto
O princípio do Novo Mercado foi fazer valer a ideia de que cada ação representaria um voto. Assim, exigências de capital organizado exclusivamente com ações ordinárias, sendo 25% dele nas mãos de investidores minoritários ou com a garantia de que todos os acionistas teriam direito a receber o mesmo que o controlador em caso de venda da companhia (um mecanismo conhecido no mercado como tag along), bem como disposições relevantes de divulgação de informações, desenharam o arcabouço do que vem sendo uma experiência bem–sucedida de avanço da governança das empresas no Brasil.
Desde então, foram realizadas 180 ofertas iniciais de ações na B3, sendo 147 no Novo Mercado. Um percentual de aderência de 82% a regras mais sólidas de governança é um dos indicadores do valor visto por empresas e investidores nesse segmento. Vale também notar a performance das companhias no Novo Mercado. O IGNM, índice que mede o desempenho de todas as ações listadas nele, acumulava até o fim de setembro uma valorização de 261%, contra 112% do Ibovespa, considerando a série histórica que retroage até dezembro de 2006.
Processo evolutivo
Ao longo do tempo, o Novo Mercado foi evoluindo. A B3 promoveu, em discussão com mercado e reguladores, atualizações em seu regulamento em 2006, 2011 e, mais recentemente, em 2018. Foram sendo incorporadas novas regras, como a exigência de que ao menos 20% do conselho seja formado por conselheiros independentes e a vedação à sobreposição de cargos de presidente do conselho de administração e de diretor presidente ou principal executivo da empresa.
As companhias também passaram a ter que divulgar sua política de negociação de valores mobiliários e um código de conduta. Em 2018, o foco escolhido na evolução das regras do Novo Mercado foi o gerenciamento de risco e controles internos, tendo como principal desafio e vitória a obrigatoriedade de constituição de comitês de auditoria, seguindo as melhores práticas internacionais. Essas mudanças serão integralmente implementadas pelas companhias até 2022.
Régua mais alta
Nesses 20 anos de história o Novo Mercado elevou a régua das boas práticas em termos de governança. Independência para tomar decisões, fiscalização e controles internos rígidos e alta transparência passaram a ser o padrão a ser perseguido pelos empresários e o mínimo exigido por grande parte dos investidores. Importante ressaltar, no entanto, que não há fórmula mágica para solução de todas as questões. A atuação, sempre em benefício da companhia, daqueles que desempenham os mais variados papeis no mundo corporativo, administradores, acionistas controladores, investidores institucionais e de varejo, é crucial para o desenvolvimento consistente do mercado de capitais brasileiro.
E esse desenvolvimento está diretamente ligado ao crescimento econômico e social do País. Com o mercado de capitais cumprindo seu papel de mobilizar a poupança para o capital produtivo, a consequência são empresas mais eficientes e rentáveis, com reflexo direto no aumento de emprego, renda e investimentos.
A B3 permanece aberta ao diálogo, atenta às demandas do mercado e às melhores práticas no Brasil e no mundo, disposta a entender como aplicá-las para aprimorar a governança das empresas sem prejudicar a estabilidade do arcabouço de regras para o investidor e para o empresário.
Flavia Mouta ([email protected]) é diretora de emissores. Coautoria de Rogério Santana ([email protected]), diretor de relacionamento com empresas
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