Os mercados de capitais têm passado por uma transformação estrutural significativa. Em paralelo aos desafios do mercado público, fortaleceu-se, nos últimos anos, um ecossistema privado diversificado e robusto, com facilidade relativa de acesso a capital, mais flexibilidade e suporte estratégico. Por isso, cada vez mais empresas têm optado por permanecer privadas por mais tempo, em vez de recorrer à estratégia de abrir o capital em Bolsa (IPOs).
Historicamente, os IPOs (ofertas públicas iniciais, na sigla em inglês) eram a principal via para captação de grandes volumes de capital, expansão de operações e aumento de visibilidade no mercado. Nas últimas décadas, porém, temos visto uma maior variedade de estratégias de investimento ganhando espaço. Muito além do mercado acionário, essas alternativas de diversificação estão acessíveis a mais investidores, que desenvolveram perfis de alocação mais sofisticados e uma disposição crescente para assumir riscos e apostar em retornos de longo prazo.
Com a expansão das oportunidades de alocação de capital, ampliou-se também a variedade de opções pelas quais as empresas podem assegurar financiamento, desenvolver estratégias e sustentar seu crescimento. Nessa nova fase nos investimentos globais, que proporciona mais instrumentos de captação aos negócios, e após uma euforia de listagens em 2020 e 2021, o papel dos IPOs tem sido reavaliado. Ainda mais com as vantagens trazidas pelo financiamento via mercado privado.
Primeiramente, a abordagem de permanecer privada por mais tempo permite que as empresas cresçam, validem e aprimorem seus modelos de negócios em um ambiente menos restritivo e mais favorável, maximizando seu valor antes de considerar uma eventual abertura de capital. Exemplos notáveis incluem gigantes como Google, Facebook, X (antigo Twitter) e Airbnb, que atingiram valorizações significativamente mais altas enquanto privadas, em contraste com seu desempenho após suas ofertas públicas. Nas últimas décadas, a média para abrir o capital aumentou de cerca de cinco para 15 anos, refletindo uma abordagem mais cautelosa e o reconhecimento do potencial de valorização antes da oferta pública.
Outro dos principais atrativos do investimento privado é a ampla disponibilidade de capital. Fundos de private equity e venture capital podem fornecer financiamentos substanciais, ao identificarem empresas com alto potencial de crescimento. Apesar do momento atual mais incerto limitar os volumes globais, o capital levantado em operações no mercado privado superou as emissões no mercado acionário em 2022 e 2023, segundo a Dealogic. Nota-se que a visão de mais longo prazo do setor privado pode oferecer algum alento a empresas que buscam captação em momentos difíceis, enquanto o mercado de ações não se dispõe a aceitar novos entrantes em meio à aversão a risco.
Mais um fator relevante para as empresas é que o investimento privado costuma vir acompanhado de um apoio estratégico e operacional para a investida, resultado da experiência, redes de contato e profundo conhecimento do setor por parte dos investidores. Esse apoio se traduz em um crescimento eficiente das investidas, permitindo que elas consigam focar em estratégias de longo prazo e não nas flutuações do mercado de ações, evitando pressões sobre seus resultados trimestrais e a complexidade dos regulamentos do mercado público. Esses aspectos são ainda mais valiosos em ambientes de negócios incertos.
Além disso, a expansão de um mercado secundário robusto contribui para reduzir a iliquidez, um dos maiores riscos associados aos investimentos privados. Com novas oportunidades para as saídas de investimentos (exits), investidores e funcionários têm uma alternativa de liquidez viável sem a necessidade de uma oferta pública.
Embora tenha perdido força nos últimos anos, com menos empresas listadas e volumes de capital reduzidos, o mercado público exerce um papel fundamental na potencialização do mercado privado e no ecossistema de investimentos geral. Um exemplo dessa sinergia é o investimento, por companhias abertas, em startups de inteligência artificial (IA), que foram destino de mais de 20% do capital de risco captado em 2023. Mais de 90% dessa quantia veio de gigantes das Bolsas dos EUA, como Microsoft (que investiu mais de US$ 10 bilhões na OpenAI) e a NVIDIA (que aplicou capital em mais de 24 startups privadas este ano).
O amadurecimento do mercado privado oferece um bem-vindo respaldo a negócios de todos os portes e setores, que têm perdido as certezas no mercado de ações como fonte de financiamento. A trajetória de cada empresa é singular e a decisão sobre o melhor caminho depende de diversos fatores, externos e internos. Não sabemos quando irá se abrir novamente a janela de IPOs, mas sabemos que o espírito empreendedor continuará sempre em busca de apoio financeiro e que hoje há mais portas abertas, em lugares menos óbvios – e muitas vezes mais acessíveis – que as bolsas de valores.
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*Oscar Decotelli é CEO do DXA Group
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