Com o abalo inesperado vindo da pandemia de covid-19, o ano de 2020 foi intenso para a economia global, com reflexos importantes sobre a economia brasileira. Nos mercados de capitais, os investidores sentiram na pele o tão comentado efeito de eventos extremos, que intensificam a volatilidade dos preços de ações e moedas. Especificamente no mercado de juros no Brasil, o ano começou com uma primeira reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que decidiu manter a taxa Selic em 2% ao ano em um cenário de inflação elevada. Esse contexto levou à reavaliação do rumo da política monetária, culminando com a elevação da taxa de juros para 3,5% anuais, neste maio de 2021.
É nesse ambiente que a indústria de investimentos e de gestão de recursos ganha novo fôlego. Afinal, ela precisa explorar uma realidade em que o gerenciamento de riscos financeiros e operacionais são fundamentais, ainda mais considerando o grau de evolução tecnológica dos mercados.
Da poupança à revolução
Há apenas 20 anos o investidor brasileiro de varejo não tinha nem acesso aos sistemas que conectam usuários aos pregões eletrônicos (home brokers). Ele guardava suas reservas na poupança, a educação financeira era restrita às classes sociais privilegiadas e a renda fixa dominava, em função das elevadas taxas de juros. Desde então houve uma revolução, e a atual indústria de investimentos e gestão de recursos se adapta rapidamente às mudanças demográficas, às novas rotinas e perfis de consumo, à utilização de aplicativos e ao acesso às informações de mercado turbinado pelas redes sociais.
Sob a perspectiva das empresas, esse período testemunhou o aumento do interesse de companhias locais pelo mercado de capitais via ofertas públicas iniciais de ações (IPOs), a forte expansão do empreendedorismo representada pelas startups em geral e pelas fintechs (startups do setor financeiro) em particular, a expansão das plataformas de negociação e o surgimento de modelos de negócios em que são protagonistas distribuidores, assessores de investimentos e casas de análises.
Desafios do novo cenário
Alguns desafios, no entanto, surgem em contraponto a todos esses benefícios. É visível o aumento de problemas relacionados a ataques cibernéticos e a práticas de crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores. Não por acaso, o ambiente normativo e regulatório torna-se cada vez mais complexo, com evolução constante.
Existem também preocupações quanto às práticas de gerenciamento de riscos financeiros e operacionais, envolvendo, por exemplo, qualidade das informações utilizadas para precificação de ativos, sofisticação das transações, risco de modelos, registro das operações, utilização de dados de terceiros, assertividade na avaliação de taxas de administração e cálculo de performance de carteiras administradas e fundos de investimento. Nesse contexto, serviços de diligência, revisões independentes com base quantitativa e práticas em gerenciamento de riscos passam a ser consideradas prioridade na indústria de investimentos.
Além disso, existe a difícil tarefa dos investidores de buscar, entre os gestores de recursos, os que oferecem uma estrutura operacional sólida. Nesse caso, são fundamentais a avaliação de conflitos de interesses do gestor e o processo para prevenção, mitigação e monitoramento contínuo desses fatores. A indústria brasileira de fundos tem regras bem estabelecidas e que, de certa forma, colaboram para o acompanhamento desses riscos, paralelamente às boas práticas de auditoria. Observa-se, ainda, a expansão de empresas familiares, o crescimento do serviço de gestão de fortunas e a oferta de carteiras administradas em que essas regras e práticas de monitoramento são mais limitadas, podendo apresentar maior vulnerabilidade.
Mais poder aos investidores
Delineado esse pano de fundo, cabe a pergunta: o que esperar para a indústria de investimentos e gestão de recursos no Brasil para os próximos anos, considerando a atual realidade de intensa evolução tecnológica e de estímulos crescentes para a inovação?
Dentre as muitas respostas possíveis, a primeira está associada ao aumento de investidores locais, agora empoderados com o acesso fácil a aplicativos para alocação de recursos e preocupados em obter educação financeira e em explorar alternativas à poupança e aos títulos públicos. Nesse sentido, as oportunidades para gestores, administradores, distribuidores, agentes autônomos e assessores de investimentos são realmente amplas e interessantes.
Com o massivo acesso a informação, educação financeira, plataformas e aplicativos relacionados, é visível o aumento de interesse do investidor em entender o que ocorre com as carteiras administradas e fundos de investimento.
Além das práticas já conhecidas de auditoria e asseguração, a busca por transparência e por assertividade das informações passa a compor as esferas de controles internos, processos e rotinas na indústria de investimentos e gestão de recursos. A preocupação geral é relacionada à confiabilidade e à segurança das informações, e o sentimento é de que os interesses dos clientes e investidores devem ser colocados sempre em primeiro lugar.
Lino Junior ([email protected]) é sócio-líder do setor de asset management da KPMG. Coautoria de Rodrigo Bauce ([email protected]), sócio-diretor em consultoria de riscos financeiros em asset management da KPMG.
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