São 30 anos de mercado, R$ 15 bilhões sob gestão em 29 fundos de investimentos nas verticais de crédito privado, previdência, listados e multimercado. Em comum, os produtos têm o mesmo DNA que caracteriza a filosofia da Sparta Investimentos. No crédito privado, apenas papeis high grade; nos Fiagro, a escolha é por títulos de grandes empresas do agronegócio; e no quesito liquidez, produtos partem de D30 – com exceção aos listados em bolsa e com negociações diárias. “Somos uma casa especialista em crédito privado high grade. Eu nunca vou ver crédito high yield, assim como fundos D0. Tem quem faça bem, mas não é a nossa escolha”, resume o CEO da Sparta, Ulisses Nehmi. Em entrevista à Capital Aberto, o executivo explica que a convicção da casa em focar no crédito de melhor risco, que exibem retornos mais modestos no curto prazo, mas que compensam no tempo, e em fundos menos líquidos acaba “selecionando investidores com visão de médio e longo prazo”. Seguradoras e fundos de pensão, por exemplo, respondem por quase metade dos R$ 15 bilhões geridos. Na conversa, Nehmi fala sobre o momento do crédito privado, as boas perspectivas na gestora para os listados e explica a decisão de transferir dois multimercados quantitativos para a ACE, o que ocorrerá no fim deste mês, por não identificar “sinergias que justifiquem a manutenção”.
Como está o mercado de crédito este ano, após mudanças nas regras para emissão de LCIs e LCAs. Qual o impacto?
Quando o CMN (Conselho Monetário Nacional) restringiu o lastro para as emissões de LCI e LCA, que estavam sendo usadas como reserva de liquidez por serem isentas e terem garantia do FGC (Fundo Garantidor de Crédito), os fundos D0 começaram a captar muito dinheiro. Com o investidor procurando alternativas, os fundos líquidos dos bancões viraram uma alternativa que capturou boa parte desse fluxo. Os fundos começaram a captar demais e distorceram parte do mercado. Hoje, tudo que é rating AAA, papeis comprados por estes fundos, está com spread bem baixo. Tanto que hoje a diferença que tem nos spreads de crédito entre o AAA e o A, por exemplo, ela está num nível historicamente elevadíssimo. São fundos que tipicamente compram ativos com ótima qualidade de crédito, como debêntures com rating AAA e títulos de bancos médios e grandes. Como consequência, esses ativos se valorizaram e os spreads ficaram pequenos, lembrando 2019.
E neste cenário, o que se espera dos gestores de crédito? Fechar o fundo para evitar um excesso de recurso entrando?
Os bancos não vão fechar. Nunca fecham. Vão continuar porque eles não estão tomando grandes riscos de liquidez. Mas para um gestor independente, especialista, que é o nosso caso, eu olho esse AAA amassado e eu falo o quê? Bom, se eu acho que os spreads dos papéis triplo A não vão fechar mais, a primeira coisa é encurtar o prazo da carteira porque só faz sentido eu alongar prazos quando eu acredito em um fechamento de taxa e busco tomar mais crédito de olho na remuneração no longo prazo. Na Sparta, estamos reduzindo posições no AAA, porque ficou caro, tem gestor comprando caro.
E onde vocês estão alocando os recursos?
A gente reduz no AAA e eleva nos papeis duplo A (AA), ou seja, com ratings um pouco menores, mas ainda assim muito bons, dentro do mundo high grade. Você tem que, obviamente, tomar um pouco mais cuidado com risco de crédito. O fato de ter uma equipe com 13 pessoas focadas na gestão de crédito, analistas acompanhando essas empresas, faz uma diferença enorme. A gente está explorando mais alternativas no duplo A e no A. Porque a remuneração adicional que eu tenho nesses dois ratings em relação ao AAA é muito grande. Eu nem vejo um risco tão maior, mas eu vejo uma remuneração muito maior. Nem sempre é o momento de tomar mais risco. A gente vai se reposicionando com o tempo. O nosso papel no final é assim, o papel de um gestor especialista de crédito.
A Sparta está com dois fundos de crédito fechados para captação, os dois de infra. Por quê?
A gente tem essa alternativa de fechar para a captação como de fato a gente fez. Um fechamos em fevereiro, quando começou aquela super demanda para as debêntures incentivadas, depois justamente das medidas do CMN, e o outro em abril. No meio de 2022, teve PEC (Proposta de Emenda à Constituição) dos combustíveis que na canetada segurou a gasolina e levou a uma deflação. Quem tinha títulos atrelados a IPCA perdeu. Muita gente começou a vender esses títulos e o spread das debêntures incentivadas foi aumentando. Quando chegou em janeiro de 2023, já tinha distorcido bastante e logo na sequência veio o episódio da Americanas e da Light e distorceu mais ainda. Em março de 2023, o nível do spread de crédito das incentivadas estava parecido com o começo da pandemia, tamanha a distorção. De lá para cá veio fechando, corrigindo, investidores começaram a ver oportunidade em papeis isentos e os fundos começam a atrair mais dinheiro. A mudança nos fundos exclusivos (2023) e depois a do CMN levaram investidores a procurar oportunidades isentas, e boa parte foi para as debêntures incentivadas. Começou a acelerar o fechamento dos spreads de crédito das incentivadas. A captação dos fundos estava muito rápida, e fechamos o primeiro fundo em fevereiro. Se tem uma coisa que não combina com crédito é velocidade. Temos dois fundos de Infra, um é Sparta Debêntures Incentivadas, que fechamos primeiro, e outro que é Sparta Debêntures Incentivadas Inflação, que por um tempo ainda tinha ativo bom para comprar. Uma hora começou a entrar dinheiro demais, uns R$ 50 milhões por dia no fundo, e fechamos em abril. Com tanto dinheiro entrando você precisa comprar muitos ativos e não vai comprar exatamente do jeito que quer, o que não é bom. Não dá para tolerar um ritmo tão rápido de crescimento. Os dois continham fechados, sem previsão. Porque se abre capta um monte. E a gente não quer.
Americanas e Light derrubaram os fundos de crédito em 2023. Produtos D0 sofreram saques o que piorou os preços no secundário. Em crédito privado, faz sentido tanta liquidez?
Não é se faz sentido ou não. Eu acho que sempre vai ter. Se você colocar uma carteira de crédito bem conservadora, com papeis bancários, curtinho, tudo bem. O problema é que o pessoal abusa um pouco ao fazer as carteiras de crédito mais arrojadas. E se o investidor do fundo tem objetivo de curto prazo, ele quer sacar quando os problemas surgem e, neste caso, um D0 talvez não seja o ideal. Fundos D0 são pouco eficientes para o investidor. No longo prazo são péssimos. Eles destroem valor em alguma medida. Não tem agregação de valor boa e, por isso, não temos na Sparta. Eu quero investidor com foco no longo prazo e que saiba que se tiver queda generalizada de preços eu sou o cara que compra e não o que vende.
Nos próximos 12 meses, o crédito privado tem fôlego para manter a atratividade e os bons retornos?
Acho que vai ser um retorno mais comportado, mais tranquilo, que é bom. Os últimos 12 meses foram espetaculares. Falando de crédito privado como um todo. Nas incentivadas é onde foi mais pronunciado esses ganhos. E tivemos duas notícias muito positivas, em julho, em relação a debêntures que desde a Lei 14.801 passaram a ter um rito mais ágil. No mês passado, o Ministério dos Transportes soltou as diretrizes para emissão dos papeis. Além disso, teve também a primeira emissão de uma debênture pela Geração Distribuída, um setor novo e que não podia emitir antes. Quem já tinha lastro e necessidade de captar está emitindo incentivada com a nova regra. Nas de infraestrutura, que ainda não saíram do papel, quem se beneficia mais são as maiores empresas, que têm risco de crédito melhor. Com a iniciativa dos Transportes, em breve outros ministérios soltarão portarias e vai destravar.
Qual é a estratégia da Sparta? Montar um fundo novo para incorporar a debênture de infra ou comprar os papeis para os fundos já existentes?
A gente está ansioso para a hora que saírem essas debêntures de infraestrutura. A gente já tem, inclusive, conversado com muitos fundos de pensão, temos mandato fechado com alguns para montar uma estratégia focada em infraestrutura que vai poder comprar as debêntures de infraestrutura. A gente tem conversado com bastante investidores institucionais que mostram interesse por ter esse tipo de ativo também.
Nos fundos que a Sparta já tem na casa, o investidor institucional é relevante?
Temos uma fatia bem expressiva de seguradoras e de fundos de pensão. Na Sparta, fazemos a gestão de R$ 15 bilhões, sendo que mais ou menos dois terços são fundos não isentos. E um terço são os fundos isentos. Deste total, seguradoras e fundos de pensão respondem por quase metade do valor. O maior bolso da Sparta, quase R$ 10 bilhões, está em produtos não isentos, é onde podem entrar a nova debênture de infraestrutura. Os outros R$ 5 bilhões estão nos fundos isentos que são os de infraestrutura. Fica estranho e parece que as palavras se confundem. Mas debênture de infraestrutura não vão integrar os fundos de infraestrutura, isentos. Se ela entra na carteira de um fundo isento, temos que tributar, teremos que fazer o recolhimento. Na prática, não vai acontecer isso. Ninguém vai comprar.
É um volume importante vindo dos institucionais, caminho que muitas gestoras ainda tentam trilhar. Como foi a aproximação da Sparta?
A gente começou a buscar os investidores institucionais em 2016 e 2017. Já tem bastante tempo que a gente trabalha com este público. E cada um tem um jeito, uma forma de trabalhar, mas tipicamente, são processos de venda mais demorados e técnicos. Por exemplo, tem fundo que a gente faz com investidores institucionais que é fundo exclusivo, que leva um tempo até você desenhar o mandato, aprovar em todas as instâncias de governança etc. É diferente de quando você já tem um produto pronto que você vai vender para o investidor em geral.
Vocês têm um Fiagro, produto que no começo do ano enfrentou talvez sua primeira crise. Como foi passar por este período?
De maneira geral, a indústria de Fiagros se formou com um perfil muito high yield. No nosso fundo, a gente veio se posicionando de uma forma mais parecida com o que fazemos nos demais fundos de crédito, sempre com um perfil mais high grade. Todo mundo acha que se tem uma taxa maior, vai ter um retorno maior. O que não é verdade. Ter uma taxa maior significa que tem mais risco e depois de descontado eventuais problemas, ou seja, taxa alta menos as provisões ou as perdas, é que se conhece o resultado. Nos problemas recentes do setor, muita cota caiu. A cota do nosso fundo segurou bem porque temos uma carteira de menor risco. Nosso Fiagro não é um Fiagro de produtor rural, é um Fiagro do agronegócio. Em junho, inclusive, fizemos uma oferta muito bem-sucedida. A gente entrou com uma oferta de R$ 150 milhões e captou R$ 187,5 milhões, que era o teto. O Fiagro ganhou muito da experiência que a gente já foi ganhando com os nossos FI Infra listados, o JURO11 e o CDI11, que mostraram como a gestora se posiciona. Temos uma preocupação em criar liquidez. Contratamos um formador de mercado para construir liquidez para os investidores. Hoje, o JURO11 é o FI Infra mais líquido que tem e com dobro da liquidez do segundo lugar. É também o FI Infra que tem o maior número de cotistas.
Vocês mandaram contribuições para a consulta pública da CVM que criará novas regras para o Fiagro. Qual a expectativa?
Eu acho que é super importante destacar que a CVM foi extremamente feliz de vir com uma regulação que ela chamou de temporária e experimental. Logo que saiu a lei, ela já saiu com uma regulamentação e possibilitou que o mercado se desenvolvesse. Agora, a CVM veio com uma proposta que eu acho que é bastante feliz também. Porque aproveita o arcabouço existente e já testado. Cada um dos tipos de ativos que existem no mercado e falou que propõe uma certa flexibilidade no Fiagro. Na verdade, pode ser que misture ou não os ativos. E você já tem vários tipos de regulação que foram bem testados ao longo do tempo e que acho que já estão razoavelmente maduras. Pelo que a CVM colocou na consulta pública, eventualmente pode ter um Fiagro que vai usar as regras do anexo 1 que é dos FIF, os antigos fundos 555. Se precisar colocar derivativo dentro, já tem previsão. Se misturar tipos de ativos diferentes, já tem previsão. Para nós, como gestores, é bem interessante.
A Sparta tem três fundos multimercado na carteira, como é a gestão dos produtos por uma casa especialista em crédito privado?
Temos duas frentes no multimercado. Ambas são pequenas. O fundo Sparta Cíclico foi o primeiro fundo da casa, com foco no mercado de commodities agrícolas. Quem toca o produto é o seu Victor, que é engenheiro agrônomo de formação e fundador da Sparta. Tem um longo histórico. É um fundo bem arrojado. Temos uma outra frente, que é a frente de quantitativos. A gente tem duas estratégias. Mas decidimos transferir para outra gestora, que é para ACE, uma casa grande especialista em multimercado. Esta vertical investia basicamente em ações e no exterior e não tem nada a ver com o restante da Sparta. Como estamos crescendo muito no crédito privado, fizemos o acordo com a ACE e vamos transferir os fundos e a equipe de profissionais. A migração é no dia 28 de agosto. Percebemos que não havia sinergias com o restante da casa, não fazia sentido. Você escolhe o que você quer fazer e o que você não quer fazer. Eu quero focar no crédito e ser o melhor que der no crédito high grade. Foi uma decisão tomada em conjunto.
Das verticais que atuam, quais as mais recentemente incorporadas na Sparta?
A parte dos fundos listados é uma experiência relativamente recente. Agora, o que a gente faz dentro dos listados, a gente já faz há muito tempo. O formato do fundo que é uma novidade para a casa. E a gente tem gostado bastante, porque consegue agregar mais valor. São fundos que não têm pedido de resgate. O investidor quer vender, ele vende paro outro investidor. Isto não afeta a gestão. O dinheiro nunca sai do fundo. O investidor vende a posição dele para outro investidor.
E olhando em perspectiva, qual das verticais deve registrar o crescimento mais robusto?
Na casa, o setor de infraestrutura, desde que a gente começou com crédito, sempre foi o com mais exposição é a infraestrutura. Quando a gente fala de infraestrutura são emissores que tem um risco menor, uma previsibilidade maior porque tem regulação. É um setor que sempre foi uma parcela importante das carteiras. A gente tem muita experiência nessa parte de infraestrutura. Vamos ficar onde a gente sabe que consegue agregar valor. Por isso não temos fundo imobiliário na bolsa, apenas Fiagro e FI de Infra. Vamos crescer ainda mais em fundos listados porque é onde a gente entende que agrega valor para o investidor.
A perspectiva é uma Selic estável ou com pequena alta no curto prazo, mas com tendência de queda no próximo ano. Isso afeta a perspectiva do crédito?
Tem quem ache que porque sou um gestor de renda fixa eu quero juros altos, um preconceito. Quando você tem juros subindo, tipicamente você tem um ambiente de aversão a risco. E aí o investidor corre para a renda fixa, mas principalmente para a liquidez oferecida pelo grande banco. Ele quer se esconder naquele título com menos risco. Quando o juro começa a cair, tipicamente as coisas estão melhorando. As pessoas começam a ter mais propensão a tomar risco. E começam a sair daquela posição muito líquida, das LCIs, LCAs. Eventualmente começa a pôr um pezinho no fundo de crédito, high grade, depois a colocar um pezinho no fundo imobiliário, no multimercado, de repente até nas ações. Eu brinco que vai enchendo os baldinhos. Ninguém fica dando cavalo de pau com carteira de investimento. Pelo menos quem tem dinheiro não faz isso. Vai tendo uma propensão marginal a tomar risco maior conforme os juros vão caindo. Quando os juros caem, o risco de crédito das empresas também cai. E isso é bom para crédito. Desde que não passe do ponto bom. Selic a 2%, como já tivemos, não é razoável no Brasil.
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