O crescimento da Valora Investimento em seus quase 20 anos de história caminhou lado a lado com o desenvolvimento do mercado de capitais. A marca de R$ 16 bilhões de ativos sob gestão (AUM) foi atingida com “várias pequenas sortes” ao longo do tempo em que mudanças no mercado encontraram a gestora pronta para aproveitar as oportunidades. A elevada diversificação, mas dentro de um espectro bastante restrito de atuação – o crédito privado – é um ponto central da gestora. Em entrevista à Capital Aberto, Daniel Pegorini, fundador e CEO da Valora, relembra a trajetória da casa e explica o racional que garantiu um crescimento longo e sustentável da operação. Nos últimos anos, comenta Pegorini, alguns produtos se mostraram menos interessantes, como o private equity. “Tínhamos um fundo, e concluímos o desinvestimento no primeiro semestre. Conceitualmente, não gostamos do mercado de private equity no Brasil. É difícil sair das empresas.” A novidade é um FII de tijolo (VGRI11), lançado este ano, que foge um pouco da proposta dos FIIs que a casa possui. “Vimos uma oportunidade ímpar para fazer um investimento na parte de lajes corporativas e compramos ativos do BTG bem localizados, além de um imóvel no Leblon.” Acompanhe a entrevista:
A Valora é uma casa com quase 20 anos de existência e surgiu quando o mercado de
crédito era muito pequeno. Como foi construir a história da casa até aqui?
Eu costumo dizer que a Valora foi beneficiada por um conjunto de sortes, desde que a gente estava no lugar certo, na hora certa, com as pessoas certas, para poder aproveitar. Quando a Valora foi criada, em 2005, era um mercado de renda fixa, crédito privado pequenininho. Poucos emitiam crédito, FIDCs eram poucos, não tinha CRI ou CRA, nem FIIs. A primeira grande sorte foi pegar o crédito privado pequeno e termos acompanhado o crescimento. A segunda grande sorte foi o movimento das plataformas de investimento, essenciais para a criação das gestoras independentes como a nossa. A terceira sorte foi pegar alguns mercados muito na fase inicial. Fomos um dos primeiros investidores institucionais sérios de FIDCs no Brasil. Também vivemos a segunda fase dos fundos imobiliários, e quando começou, tínhamos montado uma estrutura de imobiliário na casa, para gerar ativos. Para encerrar, em 2019, montamos uma estratégia agro para gerar ativos para a gente comprar. O mercado dos Fiagros atravessou na nossa frente quando estávamos prontos para atuar. No final de 2020, a gente acabou lançando o nosso primeiro Fiagro. Hoje, a gente tem sob gestão hoje R$ 16 bi e 68 fundos na casa, distribuídos por mais de 30 parceiros de mercado. A Valora já teve R$ 18 bi sob gestão, mas fizemos um desinvestimento de um private equity no primeiro semestre de R$ 2 bilhões.
Com este desinvestimento a Valora deixou de ter a vertical de fundos de private equity. Por quê?
Em primeiro lugar conceitualmente não gostamos do mercado de private equity no Brasil. Porque estruturalmente ele é muito complicado. Você não consegue sair das empresas, você faz os investimentos e depois não consegue sair, porque não tem mercado de capitais adequado, não tem IPO. Às vezes você acaba tendo que montar fundos para comprar as participações dos fundadores. Chegamos à conclusão de que, estruturalmente, a gente não tem um mercado adequado para private equity. Tem quem consegue? Tem, mas a gente não quer fazer.
Na sua visão, o que seria necessário para melhorar o ambiente para o private equity?
Se você quer ter um private equity pujante, forte, complexo e com volume, com profundidade, você tem que ter bolsa de valores. E mais do que um local para sair daquela posição, uma ponta compradora. É importante você ter uma equação de saída adequada, que é não conflituosa com o mercado, porque você vende para terceiros, você vai para o mercado sair daquela posição. Que é a equação básica do private equity nesse contexto. Uma hora teremos um mercado acionário forte, mas pelo jeito ainda demora. Existem algumas janelas no mercado, mas a gente na Valora odeia ser torcedor do mercado. Faço um negócio agora, em um private equity, imagino que até o vencimento do fundo, em oito anos, terá alguma janela para fazer o IPO. Não dá. É diferente dos Estados Unidos, onde tem janela de mercado a qualquer momento. Paramos de trabalhar com fundos private equity.
A Valora tem fundos de previdência, mas com crédito estruturado na carteira, o que não é muito frequente. Aumenta muito o risco, o investidor entende este tipo de alocação?
Previdência sempre foi um produto dos grandes bancos, até que a CVM criou a Instrução 4444, permitindo que os fundos de previdência tivessem, por exemplo, características multimercado, características de ações e de ativos estruturados. Banco trabalha crédito muito beabá, e com a mudança conseguimos montar mandatos onde perto de 35% a 45% do fundo tem ativos estruturados, FIDCs, CRAs, CRIs e FIIs. Na nossa percepção, às vezes tem menos risco do que ativos como uma debênture da Lamea (Lojas Americanas). São mais adequados, até porque uma carteira de previdência deve ser de médio e longo prazo. Ter ativos estruturados faz mais sentido em um fundo de previdência do que ter ativos high-grade e ativos líquidos. Pesamos os fatores e conseguimos montar quatro fundos previdenciários com a Zurich, com a Icatu, o BTG e a XP, e hoje os produtos têm perto de R$ 2 bilhões
Quais foram os produtos mais recentes incorporados na Valora?
O último produto em que entramos foi de infraestrutura. Temos um fundo de infra listado na bolsa, cetipado. Também iniciamos, no ano passado, um FII de tijolo. Todos os nossos fundos têm uma característica de amortização de ativos ao longo do tempo. Quando você pega os fundos de CRI, eles têm prazos médios de 2 anos e meio a 3 anos. Se você imaginar que uma operação tenha três anos de prazo, a cada ano 33% do fundo volta para dentro de casa e eu posso reinvestir. Uma das grandes maravilhas de você ter fundo fechado, listado, é que como você não tem resgate nos fundos, você tem sempre dinheiro para reinvestir. Isto permite uma oxigenação das carteiras e manter elas up-to-date em relação a taxa de mercado. Porque você vai sempre comprando.
Entre fundos fechados e abertos, como está a carteira da Valora?
Nós somos hoje, mais ou menos, meio a meio entre fundos abertos e fechados. E isso nos dá uma capacidade bem interessante, um misto de operações bem interessante sob o ponto de vista de estrutura de capital dos nossos fundos. A gente sempre tem dinheiro disponível das amortizações e esses fundos não têm resgate, portanto, eu posso programar as coisas muito bem. E, do outro lado, eu tenho fundos que estão captando diariamente. Estão nas plataformas recolhendo dinheiro todos os dias, de vários cotistas, e formando para eu montar posições. Essa estrutura acabou beneficiando a gente ao longo do tempo, por nos dar condição competitiva para comprar ativos de melhor qualidade, para ter dinheiro disponível. Na chamada pólvora seca, quando o mercado está mais agitado e tem um ativo de boa qualidade vendido a um preço que a gente considera baixo, aproveitamos.
O movimento mais recente, no ano passado, foi entrar no segmento de FII de tijolo. Qual o racional?
A gente sempre teve, dentro desse nosso espectro, a vontade de ter um fundo que possibilita ao investidor comprar um apartamento e alugá-lo. Encaramos quase como um crédito. É mais ou menos como se fosse um fundo de crédito que paga dividendo todo o mês. No final do ano passado, vimos uma oportunidade ímpar para fazer um investimento na parte de lajes corporativas, com as empresas voltando para os escritórios. O preço dos ativos ainda não estava updated em relação a essa necessidade. Montamos o FII VGRI11 no ano passado e ele começou a ser negociado neste ano. Compramos um conjunto de ativos do BTG, são lajes corporativas de alta qualidade, na região da Faria Lima, Cidade Jardim. Tem aluguéis defasados na região. Temos também um imóvel no Leblon (RJ). O fundo nasceu com cerca de R$ 400 milhões de PL. A gente está olhando outras oportunidades de aquisição.
No ano passado, tivemos o episódio de Americanas, que gerou perdas, principalmente os fundos mais líquidos. A liquidez dos fundos de crédito, da maioria, na sua visão é adequada?
Eu não tenho D0, D1. Eu não que tenho competência suficiente para fazer uma estratégia com esta liquidez em crédito. Eu, Daniel, considero um risco, principalmente fiduciário, muito grande. Mas eu também concordo que tem gente que faz isso muito bem no mercado. Tem fundos com mais de R$ 5 bilhões que fazem muito bem. Então, eu acho positivo para o mercado que eles existam, mas eu não teria. Nosso fundo mínimo de crédito é D15. E esse fundo tem 80% de ativos de liquidez e 20% de ativos estruturados. O próximo fundo meu é um D90. E depois tenho um D180.
Qual é a filosofia da gestão de risco dos fundos de crédito?
Nós trabalhamos num espectro onde você tem ativos com menor liquidez e fundos com maior prazo de resgate. Objetivando, obviamente, entregar um retorno um pouco maior para o investidor. Se a gente somar todas as nossas operações de crédito, são mais de 800 operações. Eu faço 10 operações, 12 operações por semana. Não operamos em uma frequência muito alta. O nosso negócio é comprar e carregar ativos. Não estou aqui buscando comprar hoje para vender amanhã com 20% de lucro. O que eu busco é a lógica. Tem duas coisas que eu costumo dizer que são as nossas metas aqui: primeiro, o nosso negócio é bola de neve. É todo dia ganhar um pouquinho. De maneira que, ao longo do tempo, a gente abre em relação ao CDI. E a segunda é a metodologia de gestão cebola, proteção por camadas. Quando eu faço um crédito estruturado, eu estou protegido por imóveis, por direitos creditórios, por recebíveis agrícolas, terras, apartamentos etc. Ainda assim, eu estou num FIDC que tem um monte de recebíveis e eu estou na cota sênior e debaixo dele tem a mezanino e tem uma subordinada. Se você olhar os nossos fundos, as lâminas, você vai ver que o Guarde, que tem uma lâmina de 14 anos, caminha assim, ele vai abrindo em relação a isso. Essa é a nossa lógica. Não é eletrocardiograma. É diferente. É uma curvinha. Outro ponto é o prazo. No Brasil, no crédito privado, a gente não ganha nada a mais por ficar exposto no longo prazo. Você compra um papel, um crédito de três anos de prazo e, na média, você vai ganhar, se tudo der certo, pelos 12,5% ou 12% ao ano. E se você comprar um de oito, você também ganha 12% ao ano. O Brasil não paga prêmio para você carregar posições de crédito de longo prazo. Então, a gente procura ficar no curto. Se tem um problema como o da Americanas e você está no curto prazo, você toma uma pancada menor de marcação e você tem capacidade de comprar de volta novas operações a taxas mais altas.
O investidor está mais maduro, entendendo que sair em retirada quando há problemas no mercado não é a melhor escolha?
Eu quero crer que, ao longo do tempo, esses movimentos vão se tornar um pouquinho menos frequentes. Ele vai olhar para o que ocorreu em 2020 e ver que quem saiu vendendo perdeu muito. O mercado brasileiro de capitais, falando em pessoa física, tem 15 anos, que é mais ou menos o tempo das plataformas de investimento. Antes disso, as pessoas investiam nos fundos do Itaú, do Bradesco, do Banco do Brasil. Só confiava no nome da instituição. Até 2020, teve gente que nunca tinha enfrentado um evento de crédito. No final das contas, perderam muito mais ao longo dos anos aplicando em produto ruim do que o evento de crédito privado de 2020. No Brasil você não ganha nada mais por ter crédito a longo prazo, outra coisa que você não ganha é por ter concentração de risco. O segredo do jogo é pulverização. Quando você pega um fundo nosso fundo D15 ele tem mais de 120 posições de crédito. E a máxima por ativo é 1,5%.
Os Fiagros passaram no primeiro semestre por um período bem ruim. A Valora tem um dos Fiagros que enfrentou dificuldades com a cooperativa Languiru, como está a situação?
Da mesma maneira que com o crédito privado, os investidores ainda estão pouco acostumados a olhar agro. É preciso entender que é um mercado que tem riscos cíclicos. Para os Fiagros, este foi o primeiro ciclo ruim dentro da dinâmica de mercado de capitais. Sobre a cooperativa do Rio Grande do Sul, a gente não acha que vai perder dinheiro nesse negócio, a gente tem boas garantias nesse processo. É um impacto momentâneo e, às vezes, causa um pouquinho. Se você pegar todos os problemas do agro que aconteceram no último ano, eles não são nem perto dos problemas que deram no mercado de capitais, de renda fixa, de debêntures do último ano. Se você olhar o tamanho do mercado agro, é 33% do PIB do Brasil, praticamente três vezes o mercado imobiliário, por exemplo. E ele não teve três vezes mais problema do que o mercado imobiliário.
Qual a sua expectativa para a nova regulamentação dos Fiagros que está sendo elaborada pela CVM?
Eu sempre acho positivo melhorias. Na criação dos Fiagros, o que foi feito foi pegar o arcabouço dos fundos imobiliários e jogar para dentro. Tem muita situação específica. Por exemplo, o agro é um mercado muito mais dolarizado do que o mercado de fundos imobiliários. E essa equação da questão do cambial ainda é muito complexa. Você pode ou não pode distribuir a variação cambial? Teoricamente, é possível um Fiagro com hegde cambial, mas não é claro.
Entre os investidores dos produtos da Valora há institucionais?
A gente não tem nada contra, mas também nada a favor. A gente tem aqui uma dinâmica. Eu já tive um investidor institucional em carteira e o problema do institucional é o seguinte: ele adora risco de crédito privado toda vez que o atuarial dele está abaixo do soberano (NTN-B). Quando o soberano ultrapassa o atuarial ele odeia crédito privado e aí ele sai. E causa um buraco. Não é um investidor que permanece ali. Ele não tem convicção. Outro problema é que a dois ou três anos você lida com uma pessoa diferente. Não estou falando o que nunca terei, até porque a qualificação desse pessoal vem melhorando substancialmente.
O que vem pela frente, qual ou quais das verticais você imagina que vá avançar mais?
O setor de infra é uma grande aposta. Se você olhar o Brasil, falta tudo, porto, aeroporto, estrada, energia. É tudo precário. O maior potencial de crescimento ao longo do tempo é a infraestrutura. É um mercado com ativos lastreando, perfeitamente securitizável, muito por conta da questão de crédito estruturado, project finance etc. É um match muito bom com a gente. Agora, o agro vai crescer? Claro que vai crescer, sem dúvida. Porque o governo não consegue sustentar o agro em termos de financiamento.
Para continuar lendo, cadastre-se!
E ganhe acesso gratuito
a 3 conteúdos mensalmente.
Ou assine a partir de R$ 9,90/mês!
Você terá acesso permanente
e ilimitado ao portal, além de descontos
especiais em cursos e webinars.
User Login!
Você atingiu o limite de {{limit_online}} matérias gratuitas por mês.
Faça agora uma assinatura e tenha acesso ao melhor conteúdo sobre mercado de capitais
Ja é assinante? Clique aqui