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Fazedores de negócios
Algumas certezas levaram o então executivo do banco BBA Pércio Freire Rodrigues de Souza e mais três colegas da mesma instituição a criar, em 2003, uma das primeiras butiques de fusões e aquisições do País, a Estáter
Na foto ao lado, da esq. para dir.: Pércio Freire Rodrigues de Souza, Eleonora Antici, Gustavo de Oliveira Lima e André Ferreira Martins Assumpção (Foto: Régis Filho)

Na foto ao lado, da esq. para dir.: Pércio Freire Rodrigues de Souza, Eleonora Antici, Gustavo de Oliveira Lima e André Ferreira Martins Assumpção (Fotos: Régis Filho)

Algumas certezas levaram o então executivo do banco BBA Pércio Freire Rodrigues de Souza e mais três colegas da mesma instituição a criar, em 2003, uma das primeiras butiques de fusões e aquisições do País, a Estáter. André Ferreira Martins Assumpção, Gustavo de Oliveira Lima e Eleonora Antici — junto com Pércio — chegaram à conclusão de que aquele era o momento de montar uma empresa de investimentos. O Brasil, afinal, já havia passado por vários testes (a adoção do Plano Real, o apagão, a queda vertiginosa da bolsa, a fase do “Lula comunista”) e se saído bem. “Nosso grupo era diferenciado”, conta Eleonora, esposa e sócia de Pércio. Um ano antes, em 2002, o BBA havia sido comprado pelo Itaú. “Nós não queríamos trabalhar para um banco enorme. Queríamos agilidade, e não ter aquele monte de comitês para aprovar cada decisão. Estávamos muito preocupados em não perder nossas características”, diz ela. Um desses traços, segundo Gustavo, era o gosto por fazer negócios. “No início, todo mundo se ocupava de todas as funções. A gente queria preservar isso.”

Outra certeza dos sócios da Estáter é que pensar fora da caixa é um atributo decisivo para se viabilizar fusões e aquisições. Por isso, eles não se importam em demonstrar admiração pelo dealmaker malfeitor Michael Milken, conhecido nos Estados Unidos por ter lançado títulos de alto rendimento batizados de junk bonds. “Nas décadas de 80 e 90, os dealmakers das butiques de negócios elaboravam grandes transações”, conta Pércio, recordando o auge das compras hostis. Na época, as corporations americanas eram controladas por CEOs sem um centavo investido em ações e sem preocupação em gerar dividendos — eles queriam apenas ganhar bem e controlar o conselho. Milken percebeu que podia revolucionar essas empresas mal geridas com empreendedores que comprassem as ações, botassem o CEO para fora, reeestruturassem o negócio e, com isso, multiplicassem o valor da companhia. Foi um sucesso. Embriagado pela ganância, Milken começou a sussurar para colegas as empresas que ia abocanhar. Em 1989, ele foi condenado por uso de informação privilegiada. “Michael Milken revolucionou a indústria americana. Mas desapareceu por achar que ganhar US$ 600 milhões por ano era pouco”, sintetiza Pércio.

Princípio 1

Quando a Estáter foi criada, ninguém por aqui pensava em dealmakers. “Não tinha nem mercado de capitais no Brasil”, recorda André. Certos do potencial desse nicho, os novos empreendedores reservaram R$ 3 milhões para a empresa viver durante um ano e deixaram outros R$ 10 milhões aplicados em um fundo de investimento, para imprevistos. Abriram um escritório no mesmo prédio da Avenida Juscelino Kubitschek onde estão hoje — mas, na época, sem recepcionista. Embora o sonho fosse ousado, o DNA era austero. “O Fernão Bracher [um dos criadores do BBA, que se tornou presidente do Itaú-BBA] me disse: ‘Você não tem crédito, como vai pegar projetos grandes? Daqui a quatro ou cinco anos não vai existir mais dealmaker que faça negócio de M&A’”, conta Pércio. De fato, nos Estados Unidos, esse vinha sendo o destino dessas butiques. A possibilidade de serem engolidos por um grande banco adiante não inibiu os sócios, mas alimentou dúvidas: com a chegada dos bancos estrangeiros, que empresa contrataria uma butique de investimento?

Logo em janeiro de 2003 veio o primeiro negócio: assessoria à operação de aumento de capital da Ipiranga Química na Ipiranga Petroquímica. Ainda naquele ano a butique prestaria assessoria financeira à Petrobras no fechamento de capital da BR Distribuidora, pago com ações da estatal. Para os sócios, hoje está claro que o segredo do sucesso no início dependeu mais de dizer “não” do que “sim”. Surgiram propostas para a Estáter assessorar operações menores, na linha da ideia preconceituosa de que empresa pequena faz operação pequena. Eles preferiram recusá-las.

Princípio 2

Pércio apostou na fórmula de pensar à frente. “Nosso negócio é de propriedade intelectual”, define. “A gente tinha que aparecer na empresa com uma ideia que ela nunca teve”, completa André. Foi atuando dessa forma que conquistaram como cliente o Pão de Açúcar, velho conhecido dos tempos do BBA. A Estáter assessorou a empresa na montagem da joint venture com o grupo Casino em 2005, quando Abilio Diniz permaneceu na presidência do conselho da varejista depois de dividir o controle com os franceses. Novos trabalhos seriam feitos para Diniz posteriormente — a Estáter esteve envolvida na operação de compra do Ponto Frio e das Casas Bahia em 2009. Pércio ganhou o apelido na imprensa de “banqueiro do Abílio”.

Um exemplo consagrado de pensamento fora da caixa aconteceu em março de 2007, com a montagem do projeto da compra do grupo Ipiranga por um consórcio formado por Petrobras, Braskem e Ultrapar. Um negócio de US$ 4 bilhões. “Chegamos à conclusão, na prancheta, de que seriam necessários dois ou três compradores e levamos a ideia para o Ultra, que, a princípio, não tinha nada a ver com o negócio deles. O Paulo Cunha [então presidente do conselho de administração do grupo Ultra] tinha ideia de comprar o polo petroquímico, mas a gente falou: ‘Esquece, compra a distribuição’”, resume Pércio. “Parece moleza contando hoje, mas na época…”, comenta André.

 “Nosso negócio é de propriedade intelectual”, define Pércio

Em 2009, mais uma transação ousada. A Estáter assessorou o grupo Votorantim na compra da Aracruz Celulose, que originou a maior empresa de celulose de mercado do mundo, a Fibria. “Quando a gente se encontrou com o Zé Roberto [Ermírio de Moraes], ele nos disse que já tinha sido contatado por bancos internacionais e nacionais. Por que motivo ele contrataria a gente?” A resposta dos sócios da Estáter foi: “Nós não vamos dizer vai lá e paga, como todo mundo”. Eles apresentaram um projeto que não previa desembolsos no início.

Princípio 4

Traumas, contudo, também aconteceram. Em 2009, quando o bem-sucedido histórico de seis anos registrava a conclusão de todas as negociações projetadas até então, os ventos mudaram. A butique enfrentou por quase dois anos uma maré de transações que não emplacavam. Uma delas foi a tentativa de associação entre Pão de Açúcar e Carrefour, em 2011, enfrentando o Casino. Outro negócio inconcluso envolveu uma empresa internacional. O empresário responsável morreu num acidente de avião, veio a briga sucessória e o novo chefe não defendia a transação. Trabalho e ganho de dois anos literalmente perdidos — a Estáter, até aquele momento, só era remunerada pela taxa de sucesso. “Nosso objetivo foi sempre fazer operações bem-sucedidas”, afirma Pércio. Ao longo de 13 anos, foram feitas 30 operações, com valor aproximado de R$ 80 bilhões.

O trabalho de propriedade intelectual que Pércio gosta de destacar depende de um time afiado, que os fundadores resolveram montar dentro de casa. “Não temos departamento de recursos humanos. O RH somos nós mesmos”, diz Pércio. Logo em 2004, a empresa diminuiu a capacidade de geração de projetos para formar pessoal com a sua cultura. “O maior orgulho que temos é essa turma que está aí: 80% são ex-trainees”, diz André.

Princípio 3

Cerca de 40% a 50% dos lucros gerados pela Estáter são distribuídos entre sócios e funcionários, de acordo com o desempenho de cada um. O restante vai para um fundo de investimento, gerido por Waldemar de Oliveira Battiferro Júnior, que entrou na empresa em 2004. A Estáter também direciona uma parte do que ganha — a taxa fixa que atualmente cobra nos projetos como forma de engajamento do cliente — para um instituto de responsabilidade social montado pelos sócios. A instituição é voltada para educação infantil e inserção social.

O trabalho de viabilizar aquisições animou os sócios a também fazerem as próprias. Hoje, o grupo Estáter inclui a Estáter Gestão e Investimentos, que compra participação em empresas. Além disso, detém o Fundo Cauri, usado para administrar recursos próprios.

O último grande negócio do portfólio da Estáter foi a incorporação da ALL pela Rumo, do grupo Cosan, em 2014. “Nós nunca tivemos épocas de não ter nada o que fazer, mesmo nesta crise”, diz André. “Quando está ventando a favor, tem a empresa querendo crescer, se internacionalizar, ganhar mercado. Hoje, tem gente saindo do Brasil, fechando o capital, querendo ser vendido ou querendo comprar na bacia das almas. Como brasileiro, é pesaroso, mas para o nosso negócio, não.” O fato é que, para os bons dealmakers, não há tempo ruim.


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